Os filósofos naturais do século XVII preferiam um modelo de natureza que se pudesse comparar com uma máquina. A metáfora da máquina era tão forte e generalizada que se falava de filosofia mecânica.
O filósofo e matemático René Descartes (1596 – 1650)
anunciou que “não há diferença entre uma máquina construída por um artesão e os
diversos corpos que a natureza cria por si própria”.
“É certo que não há regras da mecânica que não funcionem na
física, e tudo o que é artificial é também natural. Pois não é menos natural
para um relógio, feito do número necessário de rodas, indicar as horas, do que
uma árvore nascida de uma semente, produzir um determinado fruto”.
Foi um sentimento comum no século XVII que os humanos podem
apenas conhecer seguramente p que eles próprios constroem à mão ou imaginam com
a mente.
De todas as construções mecânica cujas características podem
servir como modelo para o mundo natural, o relógio foi o que mais atraiu os
modernos filósofos naturais.
“Na verdade, seguir a metáfora do relógio para a natureza ao
longo da cultura do início da Europa moderna é traçar os principais contornos
da filosofia mecânica, e assim muito do que foi tradicionalmente construído
como central para a Revolução Científica. Os relógios mecânicos estavam
presentes na Europa no final do século XIII, e por meados do século XIV
relógios mecânicos movidos por pesos tinham-se tornado equipamentos standard
nas grandes cidades. Os relógios primitivos tinham as suas máquinas à vista, e
consequentemente as relações entre os movimentos dos ponteiros indicando o
tempo e os meios mecânicos pelos quais esses movimentos eram produzidos eram
bem compreendidas. No século XVI, no entanto, a tendência foi a de esconder os
mecanismos em caixas opacas, pelo que apenas os movimentos dos ponteiros e não
os mecanismos estavam à vista. Os relógios públicos tornaram-se mais complexos
nos efeitos que podiam produzir e cada vez mais integrados no quotidiano das
populações. Enquanto as horas medidas pelo relógio de sol variavam com as
estações e com a latitude, as horas dadas pelos relógios mecânicos eram
constantes no espaço e no tempo, sem serem afectadas pelos ritmos naturais do
universo. A actividade humana passava a poder ser regulada pelo relógio e não
pelos ritmos da vida humana ou pelos movimentos da Natureza.
“Se queremos compreender verdadeiramente o apelo das
metáforas mecânicas nas novas práticas científicas – e a consequente rejeição
da distinção entre natureza e arte – devemos compreender as relações de poder no
início da modernidade de uma sociedade europeia, cujos padões de vida, produção
e ordenamento político estavam a sofrer mutações massivas, à medida que o
feudalismo cedeu lugar ao capitalismo”.
Em 1605, o astrónomo alemão Johannes Kepler (1571 – 1630)
anunciou ter mudado a opinião de que “a causa motor” do movimento dos planetas
“era uma alma”: “Estou muito ocupado com a investigação das causas físicas. O
meu objectivo é demonstrar qyue a máquina do universo não é semelhante a um ser
divino animado, mas antes a um relógio”.
Parte de Resenha Crítica a The Scientific Revolution, Steven Shapin, no âmbito do Mestrado em História e Filosofia das Ciências (FCUL)
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