Publicado no final de 1973, "Lip - 1000.000 Montres Sans Patron" chegava a Portugal em Novembro de 1974. Da autoria do jornalista François-Henri de Virieu, faz uma espécie de diário do chamado "Processo Lip", que ocorreu entre 1973 e 1976.
No Núcleo do Tempo do Arquivo Ephemera existe um exemplar desta obra, que relata um episódio mítico no movimento operário europeu.
Portugal, em democracia há apenas meio ano, acompanhou especialmente de perto o processo Lip, até porque coincidiu com o chamado "Caso Timex", que se iniciou em 1974 e terminou também em 1976.
Em ambos os casos, estiveram envolvidos centros de produção de relojoaria e operariado, muito dele feminino.
As lutas na Lip, em Besançon, envolveram períodos de greve, mas sobretudo de auto-gestão, depois de o patronato ter abandonado a empresa. Os operários decidiram ficar com os relógios em stock e continuar a produzir. Nesse período, foram vendidos de forma directa ao público cerca de 100 mil relógios, o que permitiu pagar o salário de três meses aos 1.200 trabalhadores envolvidos.
O processo de auto-gestão foi estudado nos anos seguintes pelos sindicatos e movimentos sociais e ainda hoje é tema académico, sobretudo em França. François-Henri de Virieu classifica-o como "um Maio 68 dos operários" e a fábrica nesse peeíodo como "uma Sorbonne operária".
François-Henri de Virieu, marquês de Virieu
Cartaz Lip no final da I Guerra Mundial (arquivo Fernando Correia de Oliveira)
A história da família Lipmann no Franco-Condado (região de França que faz fronteira com a Suíça), tem as suas raízes em 1800. Fundada em 1867, em Palente, arredores de Besançon, a Lip torna-se no maior produtor de relógios de França. A partir da I Guerra Mundial produz também material militar, sobretudo temporizadores. Em 1937, e rompendo um embargo internacional, ajuda a então União Soviética a modernizar todo o seu sector relojoeiro. Na II Guerra Mundial, aquando da ocupação alemã, a Lip é ocupada e integra a sua produção na da alemã Junghans.
Nos anos 1960, por causa da concorrência dos relógios de quartzo vindos do Japão, mas também por razões estruturais anteriores, a Lip entra em crise e passa a ter participação suíça, da Ebauches SA, um consórcio helvético de produtores de movimentos.
Depois do agitado processo de auto-gestão, a Lip é liquidada em Setembro de 1977. Os antigos empregados formam várias cooperativas. Entre elas, "Les Industries de Palente", com as mesmas iniciais - LIP.
A marca LIP ressuscita em 1990, comprada por um grupo francês. Mudou depois de mãos várias vezes mas continua hoje de capital gaulês.
Em cima e em baixo, durante o período de auto-gestão
Um modelo actual LIP
Capa do livro editado pelo Sindicato das Indústrias de Ourivesaria, Relojoaria e Correlativos do Sul, tratando do Caso Timex (de que o Arquivo Ephemera também tem um exemplar)
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