Tão suave, tão fresca, e tão formosa,
Nunca no céu saiu
A Aurora no principio do Verão,
Às flores dando a graça costumada.
Como a fomiosa mansa fera, quando
Um pensamento vivo me inspirou
Por quem me desconheço.
Bonina pudibunda, ou fresca rosa,
Nunca no campo abriu,
Quando os raios do Sol no Touro estão,
De cores diferentes esmaltada,
Como esta flor, que os olhos inclinando
O sofrimento triste costumou
À pena que padeço.
Ligeira, bella Nympha, linda, irosa,
Não creio que seguiu
Satyro, cujo brando coração
De amores commovesse fera irada,
Que assi fosse fugindo, e desprezando
Este tormento, donde amor mostrou
Tão próspero começo.
Nunca, emfim, cousa bella e rigorosa
Natura produziu,
Qu'igual aquella forma e condição,
Que as dores em que vivo estima em nada.
Mas em tão doce gesto, irado e brando,
O sentimento, e a vida m'enlevou,
Que a pena lhe agradeço.
Bem cuidei d'exaltar em verso, ou prosa
Aquillo qu a alma viu
Entre a doce dureza e mansidão.
Primores de belleza desusada;
Mas quando quiz voar ao Ceo cantando.
Entendimento e engenho me cegou
Luz de tão alto preço.
Naquella alta pureza deleitosa
Que ao Mundo se encobriu;
E nos olhos Angélicos, que são
Senhores d'esta vida destinada;
E naquelles cabellos, que soltando
Ao manso vento, a vida me enredou,
Me alegro e me entristeço.
Saudade, e suspeita perigosa,
Que Amor constituiu
Por castigo d'aquelles que se vão:
Temores, penas d'alma desprezada,
Fera esquivança que me vai tirando
O mantimento que me sustentou,
A tudo me ofereço.
Amor isento a uns olhos me entregou.
Nos quaes a Deos conheço.
Luís de Camões
sábado, 21 de junho de 2014
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3 comentários:
Por uns olhos mais depressa
se chega a Deus, se calhar,
que por muito se rezar
ou mais santo se pareça!
JCN
Deus às vezes nos conquista
por uns olhos fascinantes:
este é meu ponto de vista
sem razões determinantes!
JCN
Deus às vezes nos conquista
por uns olhos fascinantes:
este é meu ponto de vista
sem razões determinantes!
JCN
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