O chamado Relógio da Hora Legal teve ao longo do quase século de existência uma vida atribulada. Recebeu, no início, um mecanismo alemão, que era acertado por instalação electromecânica, via cabos telefónicos, a partir do Observatório Astronómico de Lisboa, na tapada da Ajuda.
O Observatório tem sido o guardião do tempo legal português e continua hoje a ser o emissor oficial do Tempo, bem como o organismo regulador das alterações que o Tempo Coordenado Universal vai sofrendo (Hora de Verão ou de Inverno, intercalação de segundos extra no final do ano, etc.)
A guarita feita de raiz para albergar o relógio mecânico no Cais do Sodré exibiu até há cerca de um ano o título de “Hora Legal”. Mas o Observatório pediu que essa designação fosse retirada, pois o relógio nunca tinha funcionado em condições. O sítio é sujeito a grandes amplitudes térmicas e nem a pala que foi acrescentada ao pequeno edifício impediu que o mecanismo sofresse com isso. Por outro lado, as trepidações cada vez mais fortes, fruto da passagem do trânsito rodoviário, também afectaram sempre a marcha do mecanismo.
Em 2001, numa acção de mecenato, e por ocasião da edição de uma série limitada de relógio de pulso, o Tissot Escudo, o mecanismo original foi retirado e substituído por um de quartzo, patrocinado pela marca relojoeira suíça. Mas nem mesmo assim o relógio andava certo, até porque desde há muito que deixara de receber qualquer tipo de sinal a partir do Observatório.
Com a chegada ao Cais do Sodré das agências europeias da Droga e do Mar, a Administração do Porto de Lisboa, entidade detentora dos terrenos, chegou a pensar derrubar a guarita da Hora Legal. Mas um movimento de cidadãos, organizado em torno do blog Observatório dos Relógios Históricos de Lisboa, impediu que isso ocorresse.
Em 2008 houve nova intervenção, substituindo-se o mecanismo de quartzo por um outro, mais exacto. Mas o problema da emissão de sinal a partir da entidade que detém a Hora Legal não estava resolvido. “Por sugestão minha, foi instalado no relógio um interface electrónico que mantém e dá a hora ao mostrador mecânico, com os seus ponteiros de horas e minutos”, explicou ao Cronos – Pilares do Tempo o Professor Rui Agostinho, Director do Observatório Astronómico de Lisboa. “Esse interface tem um relógio electrónico próprio, cuja energia eléctrica tem o apoio de uma unidade de energia independente, garantindo que mesmo que falhe a electricidade, o relógio continua a trabalhar”. Deste modo, se houver corte de luz na zona, os ponteiros param, mas reposicionam-se na hora correcta mal seja restabelecida a energia.
O relógio de quartzo que está no interior da guarita é vulgar, estando porém ligado pela Internet, através de um computador, usando o protocolo NTP (Network Time Protocol) aos servidores da Hora Legal que o OAL disponibiliza ao público, explica Rui Agostinho. “O relógio do Cais do Sodré recebe a Hora Legal e processa um ajuste sistemático da sua hora interna, estando sempre certo”.
É pena que o relógio não possua ponteiro dos segundos, para que o acerto por ele pudesse ser mais pormenorizado. Mas, como sublinha o Director do OAL, “a hora e os minutos estão correctos, e a transição do minuto ocorre na fracção de segundo correcta”. Assim, quando há mudança de minuto na Hora Legal, é nesse instante que se vê o ponteiro dos minutos a mudar a posição. O mesmo se passa para o ponteiro das horas.
Publicado em Cronos - Pilares do Tempo, suplemento do Público de 16 de Maio de 2009
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