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quinta-feira, 22 de outubro de 2009

125 anos de meridiano zero de Greenwich - mais algumas achegas no caso português

Fotografia dos participantes na Conferência de Washington e relógio com mostrador de 24 horas no Real Observatório de Greenwich

Como já referimos aqui, a 22 de Outubro de 1884, há precisamente 125 anos, foi aprovado na Conferência Internacional do Primeiro Meridiano, em Washington D. C., Estados Unidos. o meridiano de Greenwich como Meridiano de referência para todo o mundo.

A partir dessa altura, para os países que aceitassem a norma, a longitude 0° passaria pelo Observatório Real de Greenwich, nos arredores de Londres. Além disso, o globo passava a estar dividido em 24 "gomos", os fusos horários, com uma hora ou 15 graus cada um. Os fusos horários seriam contados positivamente para leste, e negativamente para oeste, até ao Meridiano de 180º - o Anti-Meridiano, situado no Oceano Pacífico, onde seria a Linha Internacional de Data.

Deve-se a Erástenes (276-196 AC) a base do sistema de coordenadas que ainda hoje se usa e que permite definir um lugar na superfície do globo, por uma latitude e por uma longitude. Se a questão da latitude sempre foi pacífica, medindo-se a partir dos zero graus do Equador, para norte e para sul, já a da longitude demorou muito mais tempo a padronizar-se.

No tempo dos Descobrimentos, para o desenho de cartas e portulanos, o conceito de meridiano zero era empregue com a sua localização naquele que passava pela ilha do Ferro, a mais ocidental do arquipélago das Canárias, daí resultado, por exemplo, o célebre Tratado de Tordesilhas. Mercator, em 1569, usou como meridiano zero as ilhas de Cabo Verde. No século XVIII proliferaram os meridianos zero, a partir de Londres, Paris, Madeira. O de Greenwich parece ter sido utilizado pela primeira vez numa carta editada em 1738.

Em Portugal, por essa altura, era considerado como meridiano zero o que passava pelo seu observatório astronómico principal. Então, era o que estava instalado no Castelo de São Jorge (e posteriormente o da Tapada da Ajuda). No Congresso Internacional de Geografia, em Antuérpia, em 1871, foi proposto o meridiano de Greenwich como referência internacional para a contagem da longitude (devido ao prestígio que atingira o observatório aí instalado).

No Congresso Internacional de Ciências Geográficas de 1881, em Veneza, foi formalmente pedido às nações para que se pronunciassem sobre o meridiano zero que achavam ser o mais lógico para si.
No ano seguinte, o Ministério português dos Negócios Estrangeiros remetia o assunto para a Sociedade de Geografia de Lisboa, para que se pronunciasse, “tendo em vista não só a questão da longitude, mas particularmente a das horas e datas”, como explica o relator da Secção Náutica da Sociedade, Ferreira de Almeida, no opúsculo A Questão do Meridiano Universal (1883). A Sociedade, por seu turno, decidiu “consultar catorze estabelecimentos e associações de sábios”. De todas elas, dez escolheram o meridiano de Greenwich, uma, o da ilha do Ferro, uma, o da ilha do Pico, e duas, um meridiano a determinar.

Em face deste resultado, a Sociedade de Geografia de Lisboa, em decisão de 16 de Março de 1883, assinada por Luciano Cordeiro, seu secretário perpétuo, votou pelo meridiano de Greenwich, como meridiano primário universal.

Em 1884, na conferência de Washington, fica oficiosamente determinado o meridiano zero como sendo o do observatório de Greenwich. Mas, a questão da escolha da localização do meridiano zero não era, como se calcula, pacífica, dadas as rivalidades entre as potências.

A Associação Comercial de Lisboa, que também tinha sido chamada a pronunciar-se (pois as relações comerciais e comunicações internacionais só podiam ter alguma lógica quando todos se entendessem sobre a padronização de hora e data), delegou o seu parecer na Sociedade de Geografia mas não deixou de dizer na nota emitida para o efeito: “A questão seria fácil de resolver se não fossem as susceptibilidades particulares [...]. Mas se aos diferentes povos que fazem uso de um primeiro meridiano nacional repugna adoptar um outro, só porque em vez de passar pelo seu território atravessa o de outra potência, onde se encontrará no mundo um ponto absolutamente neutro, seja cidade, observatório, pico, rocha ou cabo, que não esteja no domínio de uma nacionalidade qualquer, e que, por conseguinte, não dê argumento para levantar susceptibilidades?”

Portugal não aderiu em 1884 à Convenção de Washington, continuando a utilizar a hora solar média do meridiano de Lisboa, a qual diferia da hora de Greenwich em menos 36 minutos 44 segundos e 68 centésimos.

As instruções regulamentares de 1891 e 1892 relativas às horas e duração de serviço nas estações dependentes da Direcção Geral dos Correios, Telégrafos e Faróis, estabelecem que “ [...] a hora, em todas as estações, será a média oficial contada pelo meridiano do Real Observatório Astronómico de Lisboa; nas principais cidades do reino e em quaisquer pontos do país, quando a conveniência do serviço público aconselhar, serão estabelecidos postos cronométricos destinados a fazer conhecer a hora média oficial.” Assim, a hora oficial era transmitida diariamente do Observatório à estação central dos telégrafos de Lisboa e desta sucessivamente a todas as estações telegráficas do continente e ilhas adjacentes.

Só em 1911, pelo decreto-lei de 24 de Maio se subordinou a hora legal de todo o território português ao meridiano principal de referência, de acordo com a convenção de Washington.

A partir de 1 de Janeiro de 1912, todos os serviços públicos e particulares, possuidores de relógios internos e externos, passam a ser regulados e acertados pela hora legal estabelecida nos termos anteriores, cabendo-lhes o dever de tornar pública a informação horária. Foi nesta data que os relógios nacionais foram adiantados os tais 36 minutos 44 segundos e 68 centésimos, a diferença de tempo entre os meridianos de Greenwich e de Lisboa.

De notar que um dos primeiros testemunhos literários do tempo unificado, dos fusos horários, é A Volta ao Mundo em 80 Dias, de Júlio Verne, obra escrita em 1873, antes da instituição internacional do sistema de fusos horários, que no entanto já se praticava no seio do Império Britânico.
Para saber mais: História do Tempo em Portugal - Elementos para uma História do Tempo, da Relojoaria e das Mentalidades em Portugal (2003)

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