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domingo, 28 de setembro de 2014

Há dez anos... entrevista com Angelo Bonati, CEO Panerai, de visita a Lisboa


Como já aqui fizemos referência, o então e actual CEO da Officine Panerai visitou Portugal em 2004, por ocasião dos Prémios Laureus, que se realizaram em Lisboa. Na altura, falámos com Angelo Bonati e publicámos essa conversa na revista Internacional Horas & Relógios.

O texto:

Ângelo Bonatti, “skipper” da Officine Panerai esteve em Portugal

“A nossa força é a exclusividade”

Fernando Correia de Oliveira

Recentemente, no lançamento de um novo relógio de mergulho da IWC, o patrão do Grupo Richemont, Johann Ruppert, disse perante duas centenas de jornalistas especializados, em Basileia: “sigam o exemplo da Panerai e serão um sucesso tão grande como eles daqui a um ou dois anos”.

O sul-africano Ruppert, dono tanto como de uma como de outra marca, e de mais umas quantas de luxo, como a Cartier ou a Vacheron Constantin, escandalizou então um pouco os mais puristas, que consideram a IWC um clássico em termos de relojoaria e a Panerai, mais do que tudo, um fenómeno de marketing.

Mas o que Ruppert terá querido dizer é que, mesmo em tempos de crise para todos, há nichos de mercado que se portam muito bem e que a Officine Panerai é um bom exemplo a seguir, pois a sua produção não tem chegado, nos últimos anos, para as encomendas.

E, embora pareça um fenómeno recente, a empresa Officine Panerai foi fundada em 1860, como produtora de instrumentos de precisão nos campos da relojoaria e da óptica. A colaboração de longa data da Panerai com a Marinha Real Italiana e o seu sucesso em criar mecanismos de medição com qualidade – incluindo cronógrafos para os militares, calculadoras, temporizadores para torpedos e outro equipamento do género durante a I Guerra Mundial – tem-na mantido fiel à sua identidade empresarial, mesmo depois de ter sido comprada em 1997 pelo Grupo Richemont.

“Temos uma verdadeira história feita por heróis”, diz o homem responsável pelo renascimento da Panerai, o seu director Angelo Bonati, que esteve recentemente em Lisboa para assistir às cerimónias do Laureus, os Óscares do Desporto, uma iniciativa conjunta do Grupo Richemont e do grupo automóvel Daymler-Chrysler.

Angelo Bonati, ele próprio um desportista, velejador experiente, empresta com a sua fisionomia marcada e o seu estilo muito próprio, uma mais-valia de relações públicas a uma Panerai que continua a ser fortemente procurada – “há coleccionadores completamente loucos, dedicados inteiramente aos nossos relógios, que são capazes de loucuras para obter um determinado modelo”, diz.

Nascido perto de Milão, Bonati começou por trabalhar num atelier especializado no fabrico de jóias topo de gama. “Aprendi o negócio das jóias, desde a criação à produção. Sei bem o que a palavra ‘manufactura’ quer dizer”, afirma. Alguns anos mais tarde, trabalha de dia num grande armazém, à noite estuda Economia. Terminados os estudos universitários, um nome mítico na indústria relojoeira mundial, Franco Cologni, convida-o a trabalhar com a marca de isqueiros John Sterling, objectos revolucionários que, com apenas 5 mm de espessura, eram os mais finos do mundo. “Desde então, o meu destino profissional esteve sempre ligado a Franco Cologni”, explica Angelo Bonati. Nessa época, Cologni era já o líder na distribuição de isqueiros no mercado italiano e tinha a representação de muitas outras marcas, como Colibri, les Must de Cariter, Dunhill…

Bonati estava encarregado, na empresa de Cologni, de trabalhar os isqueiros, canetas e relógios Yves Saint Laurent, depois a marca Ferrari Formula, para acabar como director comercial da Cartier Itália. Em 1993 sai do grupo e lança-se numa carreira internacional, entrando na Richard Ginori, uma das mais antigas manufacturas de porcelana do mundo, fundada em 1735. Uma experiência depois completada quando se torna director comercial internacional da casa de moda Trussardi.

“Mas a minha paixão pela relojoaria continuou sempre e, quando Franco Cologni me pediu para trabalhar com ele sobre um novo projecto, disse-lhe logo que sim”. Estava-se em 1997 e o projecto era lançar no mercado internacional a marca Officine Panerai, velha casa adormecida, de gestão familiar, e que ia sobrevivendo apenas no mercado italiano antes de entrar para o Grupo Richemont.

Os relógios Panerai são máquinas extraordinárias, com uma história fantástica, já que equiparam durante cerca de 60 anos, em regime de exclusividade, os mergulhadores de combate da Marinha de Guerra italiana, nomeadamente no período da II Guerra Mundial.

Com uma estética muito própria e facilmente reconhecível, antecipando o gosto pelas caixas grandes, os modelos Panerai conquistam desde logo um público fiel, repartido pelos quatro cantos do mundo. A Panerai tem três ou quatro boutiques próprias e apenas 260 concessionários a nível mundial, três deles em Portugal. “A nossa selectividade é a nossa força”, defende o director da marca.

“É de longe a experiência mais apaixonante da minha vida”, diz Angelo Bonati, sentado numa esplanada da zona do Guincho, olhando nostalgicamente para um mar batido fortemente pelo vento. “Somos uma pequena equipa, onde todos trabalham e participam em todas as fases, desde a pesquisa à produção, passando pelo marketing e distribuição. Cada dia é um desafio, pois partimos praticamente do zero”.

O êxito Panerai tem sido também, em certa medida, seu inimigo, já que os modelos da marca, nas duas linhas existentes – Radiomir e Luminor – são dos mais imitados e falsificados. “Temos essa guerra pela frente, mas era quase inevitável, dado o êxito e a nossa pequena produção”, diz Bonati.

A Panerai continua a ter a sua sede em Milão, onde abriu recentemente um museu da marca, mas também inaugurou há meses uma nova fábrica, em Neuchatel, onde transforma movimentos de base em movimentos próprios Panerai. “A nossa filosofia continua a ser a mesma: associar o design italiano ao savoir-faire relojoeiros suíço”, diz-nos Angelo Bonati, que não esconde, porém, um outro objectivo a médio prazo – a manufactura dos seus próprios movimentos. “Esperamos ter novidades nesse sentido dentro de três ou quatro anos”.

“Estou na relojoaria há 20 anos. Não vejo outra profissão que me pudesse fazer mudar de sector, à parte talvez a de skipper”, atira Angelo Bonati à laia de conclusão. E deixa o olhar perde-se pelo Atlântico lusitano.


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