Um bife tártaro, preparado com um certo salero...
Uma história que começa com a preparação, ao vivo, de um tártaro com carne australiana, por um "mestre" espanhol, casado com uma portuguesa, donos de um restaurante suíço bem no meio das montanhas do Jura, promete ingredientes cosmopolitas, misturados com a bucólica campestre.
Foi o que aconteceu ao grupo português que, por estes dias, visitou as instalações da fábrica de mostradores ArteCad, em Tramelan. O quartel-general foi no hotel biológico L'Aubier, em Montezillion, um espaço frugal, ascético, onde a ausência de televisão nos quartos traduzia o fervor naturista e sem concessões de quem o procura. Para os interessados potenciais, informa-se que, com vista privilegiada para o lago Neuchâtel, o L'Aubier, inaugurado em 1994, primeiro hotel do género no país, tem um mini-mercado biológico e uma livraria especializada em temas mais ou menos esotéricos.
A ArteCad, uma das três maiores empresas suíças especializadas em mostradores, foi adquirida em Novembro de 2011 pelo grupo LVMH - Moët Hennessy Louis Vuitton. Produz cerca de 400 mil mostradores por ano e a TAG Heuer é, de longe, o seu principal cliente. A TAG Heuer faz igualmente parte do universe LVMH, bem como a Zenith, a Hublot, a Bvlgari ou a Dior e a ArteCad faz mostradores para todos eles. Mas não só. O que é de admirar é que marcas exteriores ao grupo, muitas delas concorrentes directas, também reconheçam na ArteCad a mestria para que lhe encomendem os seus mostradores.
O primeiro jantar em solo suíço, em Montezillion, no meio do Jura, antes da ida a Tramelan
Orlando Loureiro, um dos quadros da ArteCad (de Arte + Cadran - mostrador, em francês)
Fundada em 1885, a empresa tinha 40 trabalhadores antes da aquisição pelo LVMH e conta hoje com 220. Entre eles, muitos portugueses. Visitámos a empresa, integrados num grupo organizado pelo importador da marca para Portugal, a Torres Distribuição. E onde se incluíam três embaixadores TAG Heuer, os pilotos Pedro Lamy, Miguel Barbosa e Filipe Albuquerque (provocando natural agitação, com fotos e autógrafos).
E o nosso anfitrião foi Orlando Loureiro, filho do primeiro português a instalar-se na região de Tramelan. Engenheiro mecânico, é Chefe de Projecto na empresa.
O início de um mostrador - a prensagem
Altamente especializada, a ArteCad possui o estado da arte no que respeita à fileira industrial na concepção e montagem de mostradores, tendo também um departamento de protótipos. No mesmo tecto, agrupa cerca de 20 especialidades diferentes, desde a programação 3D à electrólise, passando pela estampagem, polimento, galvanoplastia, pintura, decalque, cravação ou aplicação de materiais como o superluminova. O seu departamento de pesquisa e desenvolvimento procura constantemente novos materiais, que possam ser aplicados nos mostradores ou no seu desenho. Para os relógios-jóia, e para as pequenas séries, a empresa criou uma linha de produção autónoma.
A colocação de ponteiros em discos, prontos para a fileira de montagem
A fase de galvanoplastia
a observação minuciosa, em todas as fases
Um mostrador inclui até 120 operações diferentes. "A nossa produção tem que estar impecável, a 30 cm, e a olho nu, são essas as regras do sector", explica Orando Loureiro. "Isto porque, com lupa, e a olhar dois minutos para um mostrador, há sempre quem encontre uma pequena imperfeição...", acrescenta, divertido.
A colocação de ponteiros
Pedro Lamy, assinando uma camisola para o filho aniversariante de uma portuguesa a trabalhar na ArteCad
Orlando Loureiro explica que os mostradores em madrepérola são dos mais difíceis de fazer. Há cada vez mais dificuldade em encontrar conchas com a cor âmbar uniforme (a poluição, o aquecimento global, dizem, serão os causadores) e o material é frágil, havendo muito desperdício. O preço da matéria-prima também tem aumentado muito nos últimos anos.
Em cima, os pilotos com Orlando e outro português a trabalhar na ArteCad
Mas as suíças também se entusiasmaram com a presença dos pilotos nacionais...
Uma tarde de sol em Tramelan, no final da visita à ArteCad. No grupo, além dos pilotos, e de três jornalistas especializados, incluindo Estação Cronográfica, havia o staff da Torres Distribuição e os quatro melhores vendedores da TAG Heuer a nível nacional
Depois da estadia em Tramelan, foi a descida até La Chaux-de-Fonds, onde está instalada a TAG Heuer e onde o grupo tomou contacto com um departamento de produção relativamente novo – dedicado em exclusividade à montagem do calibre 1887, cronógrafo automático totalmente desenvolvido in house.
Na secção totalmente dirigida à montagem do Calibre 1887, as peças vão sendo distribuídas pelas bancadas dos relojoeiros, através de um sistema de passadeira, computorizado, semelhante a um sushi bar… Este método foi inovador na indústria e implicou um investimento considerável, mas a produção e a qualidade têm provado que valeu a pena.
As provas de estanquecidade incluem a imersão em marmitas especiais
Uma gota de água fria no mostrador revela se há ou não condensação no interior. Se houver, é porque o relógio não é estanque, terá que ser rejeitado
Trabalhando no já mítico Calibre TAG Heuer Monaco V4
No final da visita a La Chaux-de-Fonds, o grupo passou duas horas à conversa com Guy Semon, responsável pelo Departamento de Investigação e Desenvolvimento da TAG Heuer. Vindo de um mundo completamente estranho à relojoaria, este engenheiro aeronáutico trouxe um olhar fresco à indústria. desde logo, foi o responsável pela produção comercial do V4. Depois, e numa linha de coerência admirável, tem apresentado calibres de chamada muito alta frequência.
"Não estou sozinho nesta tarefa", apressa-se a dizer. "Sou um maestro de uma pequena equipa que toca música sinfónica... não, não tocamos funk, nem música contemporânea sem harmonia". Com isso, Guy Semon evoca a melodia de fundo que é a Alta Relojoaria (como uma peça de Mozart, acrescenta ele), com salpicos de modernidade revolucionária.
Depois dos exemplares de muito alta frequência Mikrotimer e Mikrograph, Guy Semon apresentou este ano o Mikrogirder. Um cronógrafo sem espiral, que usa antes no orgão regulador um sistema de palhetas, uma delas a vibrar a 7,2 milhões de alternâncias por hora (frequência de mil hz), 250 vezes mais rápido que um cronógrafo normal, o que lhe permite medir fracções de tempo de 5/10.000 de segundo.
Guy Semon dizia-se confiante na obtenção da vitória, no dia seguinte, no Grande Prémio de Relojoaria, em Genebra. O relógio tinha-se candidatado ao prémio Inovação. Na noite de gala, a consagração foi maior – um júri internacional considerou o TAG Heuer Carrera Mikrogirder Chronograph não apenas inovador, mas o melhor relógio de 2012.
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