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quarta-feira, 21 de outubro de 2015

Fora de Série Especial Relógios 2015 - artigo de análise da conjuntura


Já saiu o Fora de Série Especial Relógios 2015, suplemento anual do Económico onde colaboramos desde o primeiro número. Na capa, Joaquim de Almeida, que é protagonista no interior de uma produção, na sua qualidade de Embaixador da IWC Shaffhausen.


O habitual artigo de análise:

Numa conjuntura económica muito difícil

À espera do relógio conectado suíço

Fernando Correia de Oliveira

Jean-Claude Biver, responsável pela Divisão de Relógios no maior grupo de luxo do mundo, o LVMH, vai anunciar segunda-feira, 9 de Novembro, às 11h00 locais, em Nova Iorque, o smart watch que a TAG Heuer, marca do grupo, desenvolveu numa parceria com a Intel e a Google.

Biver, que acumula o cargo com a presidência da TAG Heuer referiu-se numa entrevista à televisão norte-americana CNBC ao novo produto como “Connected Watch”, dizendo que ele vai custar cerca de 1.800 dólares, e que chegou a estar preocupado com o seu preço médio. Mas terá ficado mais tranquilo, disse, quando a Apple anunciou o seu smart watch em parceria com a Hermès, com preço médio semelhante. O Apple Watch edição Hermès tem preços que variam entre 1.100 e 1.500 dólares. Bíver, considerado “um mago” da indústria relojoeira suíça, depois do trabalho que fez na Omega e Blancpain (grupo Swatch), mas sobretudo na Hublot, que venderia depois ao LVMH, não parece assustado com o fenómeno dos smart watches, que muitos antecipam como sendo o fim da indústria relojoeira suíça tal como a conhecemos ou, pelo menos, o fim do relógio de quartzo não conectado.

Para Bíver, um luxemburguês naturalizado suíço, com uma vasta quinta nas margens do lago de Genebra, produtor de queijo e vinho, “os smart watches vão incentivar o consumo de relógios, pois as novas gerações já se começam a esquecer de levar um no pulso”. “De certa forma, o Apple Watch é um grande promotor de relógios verdadeiros. A recente parceria com a Herrmès também marcou a entrada da Apple no mercado do luxo”, diz Bíver.

Resta saber, para já, qual o verdadeiro êxito do próprio Apple Watch. Ele ainda não chegou a Portugal mas, nos Estados Unidos e outros países onde se encontra à venda há meses, este novo objecto mnão veio criar qualquer tipo de apetência maciça ou um fenómeno social novo como foi o aparecimento do iPhone ou do iPad. A Apple, sintomaticamente, tem-se recusado a divulgar número sobre a venda do Apple Watch.

Bíver disse à NBC que a TAG Heuer não tem a pretensão de desafiar a Apple (que estima vender 4 ou 5 milhões dos seus relógios no primeiro ano), mas antes liderar a indústria relojoeira suíça. “Temos dois excelentes parceiros, que nos permitirão chegar ao mercado sempre actualizados e nunca com produtos ultrapassados”. O grande óbice dos smart watches é a sua autonomia – dois dias no máximo. Mas o segundo grande obstáculo é mesmo esse que Bíver afirma como vantagem - para se estar sempre actualizado, será necessário mudar de smart watch todos os anos… ora, a 1.800 dólares cada…

De qualquer modo, a profissão de fé de Bíver é forte. Diz ele à NBC: “Acredito na tecnologia usada junto ao corpo, assiste-se a um desenvolvimento explosivo nesse campo. Na moda, acessórios e até mesmo na comida. O objecto conectado fará parte do nosso futuro. Mas, na TAG Heuer, não podíamos estar neste mundo com os nossos próprios recursos, pois somos relojoeiros. O Connected Watch não é apenas um relógio, é um computador. Para isso, precisámos da Intel e da Google”.

Bíver diria antes ao jornal alemão Die Welt que o Apple Watch tinha sido, para ele, uma decepção. “Não tem sex appeal. É demasiado feminino e parece-se demasiado com os smart watches já existentes no mercado”.

Já o novo relógio conectado da TAG Heuer, esse sim, terá a aparência de um relógio normal. “Foi esse o nosso maior desafio – como fazer um relógio conectado que parece um relógio normal, com o DNA habitual da indústria relojoeira suíça?”.

Conjuntura difícil

Os dados estatísticos dos últimos três meses, revelados pela Federação Relojoeira helvética, fazem notar uma diminuição acentuada das exportações para o principal mercado – Hong Kong, com quebras da ordem dos 40 por cento em valor; e para o terceiro mercado – a China continental, com reduções da ordem dos 10 por cento.

Apesar desta conjuntura desfavorável, o maior grupo relojoeiro do mundo, o Swatch Group, está optimista. O seu CEO, Nick Hayek, disse ao Wall Street Journal que as perspectivas para as suas marcas (que vão da Breguet à flikflak, passando por Omega, Longines, Tissot ou Swatch) são de crescimento sustentado, em todo o mundo, mesmo na Ásia.

Isto, apesar de uma valorização do franco suíço, ocorrida no início deste ano, e da potencial concorrência dos smart watches. “Não ignoramos a tecnologia smart, mas não temos que dizer sim a toda a grande tendência, numa mentalidade de rebanho… fazemos relógios, e não computadores para o pulso”.

Para muitos observadores, no entanto, a Swatch, enquanto marca, e dado o seu tradicional espírito inovador e de tendência, está a perder a batalha dos smart watches, quando deveria, como seria expectável, liderá-la. O lançamento de um obscuro smart watch dedicado ao vólei de praia (?), o Swatch Touch Zero One, será prova de que o Swatrch Group perdeu o pé ou, mais uma vez, acertou e não investiu milhões e milhões numa moda efémera?

Três factores negativos parecem estar para ficar, como ameaça estrutural à tradicional indústria relojoeira suíça – o relógio conectado, o franco forte (95 por cento dos relógios suíços são exportados), a desaceleração da economia na China e as campanhas lançadas por Beijing desde 2012 contra a corrupção e os “presentes”.

Jean-Claude Bíver acredita que esses três factores se farão sentir ainda mais em 2016, um ano que, segundo ele, será de prova de fogo para a generalidade das marcas suíças. “Vamos ter um ano difícil, não apenas nós, toda a indústria”, previu ele à Bloomberg.

A redução das exportações em Agosto, que continuou nos meses seguintes, ameaça com um fecho de 2015 interrompendo um ciclo de crescimento que já dura há seis anos. Sintomaticamente, um estudo periódico publicado pela Deloitte revela que os CEO’s das grandes empresas relojoeiras suíças estão num nível de pessimismo como não se registava desde há quatro anos (42 por cento de optimistas, contra 65 por cento no ano passado). Crescente entre este grupo a ideia de que o smart watch é a principal ameaça concorrencial.

Sabe-se que a maior parte das compras de relógios por parte dos chineses se faz no exterior (Hong Kong incluído). Mas a recente desvalorização do yuan também ajuda a uma previsão de diminuição do consumo chinês no exterior.

A Suíça é o primeiro exportador mundial de relojoaria, em termos de valor. O preço médio por peça, ronda os 750 francos, contra 27 francos para os relógios produzidos em Hong Kong, ou 7 francos para os produzidos na China. No segmento de luxo, os relógios suíços dominam quase a cem por cento a nível mundial.

Nesse segmento de luxo domina o Richemont Group, que tem no portefólio marcas como a Cartier, Van Cleef & Arpels, Montblanc, Jaeger-LeCoultre, A. Lange & Söhne ou IWC. Nos primeiros cinco meses do ano, aliás, viram crescer as vendas em 16 por cento em euros e em 4 por cento nas moedas locais. Teoricamente, são os menos preocupados com o fenómeno smart watch.

Voltemos a Bíver, que comanda, além da TAG Heur, a Zenith e a Hublot. Para ele, o Apple Watch “parece ter sido desenhado por um estudante no seu primeiro trimestre”. O facto de a Apple ter ido buscar à TAG Heuer o seu Vice-Presidente para as Vendas, Patrick Pruniaux, poderá explicar em parte o azedume de Bíver. E faz aumentar as expectativas sobre a estética do TAG Heuer Connected Watch.

O sector relojoeiro suíço é dos mais competitivos, dinâmicos e criativos no quadro económico do país. Sabe-se que a Suíça lidera a nível m mundial os índices de competitividade e inovação.

O que torna ainda mais estranho, voltamos a notar, que o maior grupo relojoeiro do mundo, o Swatch Group, com uma base industrial forte e quase sem concorrência, com equipas ultra-especializadas em investigação e desenvolvimento, tenha até agora tido tão pouco a dizer quanto ao fenómeno dos relógios conectados.


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