Est. June 12th 2009 / Desde 12 de Junho de 2009

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quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Meditações - o relógio da Estação do Rossio

GRANEL DAS MUITAS ACONTECÊNCIAS

QUE NÃO DEVEM TER LUGAR EM 1974


A Avenida da Liberdade (atenção, Pedro!) ser vendida aos

talhões para construções imobiliárias. (Não haverá esse perigo,

por enquanto, se vocês se portarem bem.)

- Serem usados foguetes silenciosos nas festas de

romarias.

— Um sujeito não ser atropelado no seu corpo e nos seus

direitos.

— Ter o seu passamento Inácia Coreto, a ilustre promotora

de serões de arte.

— Manuela Fonseca mudar para Colgate.

— A Rosa casar com o Xico.

— Os paralelipípedos amontoarem-se contra os poetas.

— Os executivos terem um pouco menos de energia e um pouco

mais de bom senso.

— Os faróis da costa começarem a piscar para terra.

— Nuno Júdice publicar as suas Viagens Completas.

— Mário Castão caminhar para o mar.

— Mário Henrique Leiria (um abraço, ó Mário!) beber menos

gin-tonic.

— A força pública começar a usar, nas suas actuações,

serpentinas multicores.

— Eusébio jogar com as botas de ouro que ganhou.

— Joaquim Agostinho dopar a sua bicicleta.

— As flores dizerem às abelhas: «Basta!».

— E, já que falei de abelhas, Fernado Lopes sair com outra

longa-metragem.

— Amália Rodrigues lançar, no Estádio Nacional — e, se

possível, para fora — o seu último Disco de Ouro.

— A nacional-caixotaria deixar de invadir as áreas

urbanas, suburbanas, rurais e todas as que lhes são intermédias.

— A Televisão oferecer-nos um novo (e renovado)

Telejornal.

— Rodolfo Iriarte conseguir ter a secretária arrumada.

— O décimo terceiro mês ser logo a seguir ao décimo

segundo ou logo antes do primeiro.

— Nixon vir a Lisboa para aumentar a sua credibilidade.

— Visconti começar e acabar «A Morte em Beleza».

— O Parlamento discutir e aprovar a Lei de Fins.

— Uma produtora de filmes realizar a longa-metragem «A

tudo o vento a levou».

— Os pianos, no âmbito de um congresso para a protecção da

Natureza, devolverem aos elefantes o marfim.

— Manuel Brito, da «111», abrir uma galeria no Cacém.

— Os brasileiros que nos visitam deixarem de dizer que

estão encantados ou muito emocionados por se encontrarem em

Portugal.

— Os cultores da incivilidade meterem gasolina, em vez de

ar, nas rodas dos seus carros.

— O EXPRESSO sacudir os bandos de gralhas que nele pousam

semanalmente.

— Lopes de Souto não escrever sequer um fundo.

— Artur Portela Filho passar a assinar De Queiroz.

— Ruben A publicar «A Retorre da Rebarbela».

— A Antónia e o Ruy Leitão porem todo o País a comer

alcachofra.

— O «Cinéfilo» começar a publicar a fotonovela

«Simplesmente Mário».

— O Ritz abrir, no seu recinto, um parque de campismo.

— O Joaquim Botelho de Sousa comprar, para a sua colecção,

o relógio da Estação do Rossio.

— O João Charters de Almeida abrir uma sucursal da Mancha

nas Cortes, em Leiria.

— Certo locutor da Rádio deixar de empregar expressões

como «Esta jornada revivalista» cada vez que põe a tocar discos

com músicas doutros tempos.

— Os caixões terem melhor ar.

— A Marquesa de Arrobas lembrar-se (já não seria sem

tempo!) da lei republicana que aboliu os títulos nobiliárquicos

e passar a chamar-se apenas Maria Teresa Eugénia Vitória da

Silva Soares de Souza Rodrigues de Albuquerque e Menezes

(Cortiçal).*

— A Maria Aguiar deixar de ser uma simpatia.

— O rei Faiçal assinar um contrato com o Hergé para entrar

nas histórias do Tim-Tim.

— O Gérard Castello-Lopes abrir uma nova sala de cinema

num dos supermecados Pão de Açucar.

— José Athayde deixar de gostar de cavalos.

— Os palestinos terem a sua terra.

— Ruella Ramos apanhar a Mosca.

— O futuro deixar de ser o que, afinal, já não era.

— Cubillas ter saudades da Suíça.

— Brejnev vir assistir a uma tenta no Ribatejo.

— Os presos serem autorizados a irem a suas casas mudar de

roupa.

— O ar ser, finalmente, mais leve que o ar.

* É pura coincidência.

 

Alexandre Oneill

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