Est. June 12th 2009 / Desde 12 de Junho de 2009

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sábado, 14 de junho de 2014

Relógios & Canetas online Junho - visita à manufactura de mostradores Fluckiger, com os relógios Patek Philippe


Na Cadrans Fluckiger, em Saint-Imier, Suíça

Fernando Correia de Oliveira

Os rostos do tempo

Visitámos uma das poucas manufacturas de mostradores topo de gama do mundo – num sector onde muitas das artes estão a desaparecer. Uma pequena empresa pertencente ao universo Patek Philippe, mas que também serve outras marcas.

Pela cara se vê quem és. Num relógio, o rosto do tempo é, obviamente, o mostrador. Por detrás dele, todo um conjunto de órgãos internos, com coração (conjunto volante/espiral), pulmões (a corda), ou músculos e articulações (a cadeia cinemática, com as suas rodas dentadas e óleos). A caixa é o suporte deste pequeno “ser”, um exosqueleto, qual carapaça de uma tartaruga ou crustáceo. Os braços, claro, são os ponteiros. E os olhos – as janelas, os buracos no mostrador. Tudo o resto é importante, mas a fisionomia de um relógio é dada pelo mostrador e pelo seu aspecto estético. Há mostradores e… mostradores. Para se ter uma fisionomia única, marcante face à multidão, é preciso detalhe, savoir-faire, acabamento – um mak-up digno, irrepreensível, resistente ao tempo.

Muitas vezes se pergunta porque é que um relógio topo de gama custa o que custa. Muitas vezes, num relógio, estão envolvidas 700 pessoas, grande parte delas especialistas. Na cara do tempo, nos mostradores, há muitas horas de trabalho minucioso – entre a precisão da máquina e o sentimento do artesão, o equilíbrio entre o que cada um pode fazer de melhor.

Fundada em 1860 e propriedade da Patek Philippe desde 2004, a sociedade Cadrans Fluckiger é especialista no fabrico de mostradores topo de gama e seus componentes. Com 100 trabalhadores, produz anualmente 100 mil mostradores. Fá-lo naquilo que chama “grande série”, a partir de 500 unidades; “série média”, de 100 a 500 unidades; e “pequena série”, de uma a 5 unidades. Cada mostrador envolve entre 50 e 110 operações e o tempo médio de fabrico é de 4 meses.

Para um mostrador modelo novo, tudo começa na Célula de Protótipos, onde uma equipa de seis pessoas estuda a fiabilidade do pedido do cliente. São feitos desenhos técnicos (envolvendo dimensões, relação com a caixa, altura dos índices, etc.) É depois elaborado um dossier estético (com cores, acabamentos, escolha de índices, etc.). Finalmente, nesta fase, são produzidos 5 exemplares de ébauches de mostrador (exemplares não acabados).

Se a decisão é passar à produção, ela pode ser não limitada, limitada ou de série especial. A empresa também se encarrega do restauro e reparação de mostradores.

Na fileira industrial, as ébauches de mostradores começam pelo corte de placas de latão ou outro material, partindo da chamada base universal (que servirá para todos os modelos de mostrador). Numa segunda fase recortam-se as janelas necessárias às indicações que se querem mostrar – data, dia da semana, fases de lua, etc.

Depois, os mostradores passam a máquinas CNC, onde passam por fases de paletização e de remoção dos pinos traseiros vindos da fase anterior. Perçage, noyure, perlage, contournage, tournage e diamantage são termos franceses que traduzem os acabamentos, feitos à máquina, a que um mostrador é submetido nesta fase.

Seguem-se a galvanoplastia – o depósito metálico na superfície do mostrador, através de electrólise. A espessura depositada vai de 0,01 microns a 10-15 mícrons (a espessura de um cabelo). Os materiais depositados são ligas de ouro, prata, ródio, ruténio, níquel, etc. A cor final do mostrador é obtida através da imersão sucessiva em diferentes banhos químicos e a paleta actual, com 23 variações, vai do Champanhe ao Aurinox, do Auropink, passando pelo Gris Doré, Ardoise, Blackore, Gris Meteor, Brun PPSA ou Doré, Gris US, Ródio, Flash Argent ou Velouté, Bleu Gris ou Roi e Negro.

Se pensa que, com isto, temos um mostrador pronto, enganou-se. Segue-se o acabamento, que pode ser mate, areado, aveludado, acetinado, acetinado vertical ou soleado. Aqui, entra a mão humana e a experiência acumulada ao longo de séculos, transmitida boca a boca, entre mestre e aprendiz.

Para um olhar treinado, sabe-se logo se o acabamento foi com CNC ou manual. E, postos lado a lado dois mostradores, um passado pela máquina, o outro tratado durante horas pelo especialista artesão, percebe-se que o tempo não foi perdido – a reflexão de luz é muito mais efectiva quando o trabalho é feito à mão. Alguns, mais treinados, conseguem mesmo ver a “assinatura” do artesão, já que são muitos poucos os que sabem fazê-lo – na Suíça, uns 50, na Patek Philippe, dois mestres (um deles português) e um aprendiz.

E, se falamos em artesão e em savoir-faire ancestral, não podemos esquecer que os Cadrans Fluckiger dispõem dos melhores mestres do mundo em guillochage, esmaltagem ou sertissage (cravejamento de pedras preciosas). Alguns dos modelos mais complicados incluem essas artes.

Se, no início (ainda se lembra?) foi preciso retirar os pinos traseiros do mostrador, agora é preciso colocar outros, que irão encaixar-se no calibre ou na caixa. Esses pinos são também fabricados na Cadrans Fluckiger e ali soldados aos mostradores.

Entretanto, os índices, em forma de bastão, numeração árabe ou romana, e com vários formatos, são facetados à mão e colocados também manualmente no mostrador.

Um controlo final, à vista, um a um, dá o visto de aprovação ao mostrador. Que pouco depois será o rosto do tempo num Patek Philippe.

A Cadrans Fluckiger serve a Patek Philippe mas também outras marcas de alta rejoaria – quando visitámos as instalações, que estão e obras de alargamento, não pudemos fotografar nenhuma das fases de produção, mas vimos mostradores feitos para terceiros.

A viagem incluiu ainda uma ida a la Chaux-de-Fonds,, onde visitámos um conjunto de outras três empresas pertencentes à Patek Philippe ou onde ela tem participação – Calame & Cie (caixas de relógios de gama alta), Poli-Art (polimento) e SHG (Sertissage Haut de Game). Também elas fornecem a terceiros.




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