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quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

O quilómetro do luxo - artigo na revista Torres


Já saiu mais um número da revista Torres. Nesta edição, colaborámos com um artigo sobre a problemática do luxo e a situação da Avenida da Liberdade, o "nosso" quilómetro de luxo...

Ainda será preciso melhorar muito a Avenida

Construindo “o quilómetro de luxo”

Fernando Correia de Oliveira

Lisboa, plataforma de civilizações e cruzamento de variegadas gentes, cada vez mais na moda, destino de cruzeiros e de turismo de congressos ou de curta duração, parece ter conseguido fixar uma das suas artérias históricas como eixo do comércio topo de gama. Mas ainda há muito caminho a percorrer para que a Liberdade seja um Luxo.

Os executivos máximos das mais importantes marcas mundiais de luxo estão optimistas quanto ao crescimento da indústria, esperando um aumento das vendas em mais de 9 por cento nos próximos doze meses, segundo uma sondagem recente à escala global.

A “Global Luxury CEO Survey”, da autoria da Ledbury Research, consultou os executivos quanto ao comportamento do mercado, mas também quanto às estratégias das marcas. Cerca de 90 por cento dos inquiridos estão optimistas sobre o segmento do luxo.

Segundo a sondagem, os CEOs das grandes marcas de luxo (empresas que facturam anualmente de 50 a mil milhões de dólares) estão especialmente preocupados com os seus clientes VIP. O estudo abrange os segmentos de viagens, vestuário, relógios, joalharia, perfumes, electrónica, entre outros. Fazendo a média, os CEO’s destas empresas esperam um crescimento de 9 por cento nos próximos 12 meses.

Apesar do optimismo, os executivos preocupam-se com a instabilidade política. A maioria pensa que o mercado norte-americano será o impulsionador principal do crescimento no luxo, seguidos da China. Pensa-se que os turistas chineses gastarão no próximo ano acima dos 100 mil milhões de dólares no exterior, o que beneficiará especialmente países que recebem a maior fatia deste gigantesco influxo de visitantes.

O crescimento do mercado do luxo dependerá em muito do comportamento dos consumidores VIP, que não encaram o preço como impeditivo – diz o estudo. Este grupo representa 10 por cento dos consumidores de luxo, muitos deles sendo compradores para si próprios e não tanto compradores de presentes.

Como os ricos estão a ficar cada vez mais ricos, as marcas de luxo estão a reposicionar-se, adaptando as suas estratégias para cativar os consumidores de topo, procurando situar-se em posições relativas cada vez mais exclusivas.

Nesse sentido, a estratégia tem sido e continuará a ser a de negligenciar os pontos de venda tradicionais e criar outros vocacionados para os VIP, aumentando também os preços. Esta estratégia ajudará as marcas a diferenciarem-se das suas concorrentes.

Os aumentos de preços serão justificados pela utilização de melhores materiais e por produção mais exclusiva. Muitos dos CEOs consultados estão preocupados por as suas marcas se terem tornado demasiado ambíguas, por terem feito parcerias com segmentos mais baixos e por estarem em localizações não exclusivas.

As principais prioridades das marcas de luxo para os próximos 12 meses incluem o investimento no digital, a melhoria do retalho, a fortificação da identidade de marca, a melhoria do serviço pós-venda.

Segundo o estudo, o aumento das vendas sentir-se-á mais fortemente no período de Verão, e provocado pelo consumo dos VIP, que trabalharam duramente durante o ano. Por outro lado, as marcas deixarão de procurar atrair tanto consumidores aspiracionais.

A situação em Portugal

Em Portugal, onde nos últimos 30 anos os Centro Comerciais foram um fenómeno de sucesso, e onde o comércio de rua sofreu drasticamente, há um eixo de excepção, que tem atraído investimento de qualidade e que, em cinco anos, se consolidou como artéria do luxo – a Avenida da Liberdade, em Lisboa.

O defensores dos Centros Comerciais não deixam de salientar as suas vantagens: oferecem mais escolha, entretenimento, conveniência e agitação que uma artéria comercial. Além disso, servem de local de encontro com amigos, disponibilizam oferta variada de consumo, complementam com cinema e outras diversões. Estão ao abrigo do clima e têm estacionamento.

Os adeptos do comércio de rua qualificado falam de exclusividade dos espaços, possibilidade de andar ao ar livre, convívio em esplanadas a céu aberto, num ambiente mais saudável. Mas, todos eles querem, idealmente, que a artéria de luxo seja afinal “um centro comercial com muitos telhados”.

Ora, para a Avenida da Liberdade, no seu quilómetro de comprimento, se tornar num verdadeiro eixo do luxo, muita coisa terá que melhorar. Desde logo, todo o mobiliário urbano, os ajardinamentos, a iluminação, terão que ser requalificados. A segurança terá que ser mais evidente. A poluição – sonora ou do ar, provocada pelo tráfego – terá que diminuir.

Numa estratégia da procura do tal “centro comercial com muitos telhados”, o retalho topo de gama terá que se juntar numa estratégia de lobying junto da edilidade e do governo central, para conseguir essas melhorias. Terá que criar uma marca comum, Avenida, reconhecível pelo consumidor nacional e estrangeiro. A organização de eventos especiais na zona, como a Fashion’s Night Out, segue essa estratégia, que deverá ser afinada e alargada a outras ocasiões.

Os pontos de venda de luxo já localizados na Avenida da Liberdade têm na sua maioria serviço de vallet parking, obrigatório, dada a dificuldade de estacionamento na zona. Muitos deles têm, no interior, espaços reservados aos clientes VIP. Cada vez mais, a discrição é um argumento de decisão quando o cliente topo de gama se decide a ir a um destes pontos.

Num esforço comum de estratégia para captação de novos clientes, os pontos de venda deveriam encomendar um estudo caracterizando o consumidor que prefere a Avenida aos Centros Comerciais ou a lojas fora do eixo. Mas será, em princípio, encontrar muitos traços comuns entre um consumidor angolano e um chinês, entre um brasileiro e um russo. Enquanto uns não se importam de ser vistos a passear sacos de griffe, outros pedem que as compram lhes sejam entregues em casa ou que alguém as vá colocar na mala do carro… discretamente.

Na relojoaria e joalharia, propriamente ditos, tem havido investimento importante nos pontos de venda, que seguem as tendências mundiais – atendimento personalizado, em espaço fora do olhar do grande público, por empregados altamente treinados e, em muitos casos, da nacionalidade do consumidor. Embora, nos últimos anos, se tenha assistido a uma invasão do high-tech no aspecto da exposição dos produtos – realidade virtual, realidade aumentada, projecção a 3 dimensões – o cliente VIP tradicional impressiona-se pouco com este tipo de gadgets, prefere tocar e voltar a tocar no relógio ou na jóia, sentir-se física e emocionalmente ligado ao que está prestes a comprar.

Antes de entrar na loja, sim, as novas tecnologias, a informação digital, as redes sociais, são procuradas por este tipo de cliente. Que está cada vez mais bem informado quando chega ao ponto de venda. Viu críticas internacionais sobre aquela determinada peça, viu filmes demonstrando como ela funciona, assistiu ao vivo pela Internet ao lançamento mundial…

Acima de tudo, o cliente VIP procura comodidade no espaço, atenção, especialização no conhecimento por parte de quem o atende. Cliente habitual é um tesouro a guardar ciosamente por cada ponto de venda. Mas o cliente de passagem, o turista, é também um bom cartão de visita se falar bem da sua experiência em Lisboa a amigos e conhecidos.

Isto traz-nos à memória o incidente recentemente tornado público por Oprah Winfrey quando, em Zurique, uma empregada lhe terá dito de forma mais ou menos directa que a mala que tinha pedido para ver estava fora do seu alcance…

Quem está do lado de lá do balcão não pode julgar pelas aparências. Será bom lembrar – do lado de cá e de lá do balcão, já agora – que rei e peão voltam a ser arrumados dentro da mesma caixa, depois de jogada a partida de xadrez…

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