A nossa obra é o nosso monumento. Não o cerquemos de grades de ferro, com sentinelas armadas para o proteger, nem desperdicemos a existência a doirá-lo constantemente de novo a oiro fino, a brunir-lhe as asperezas com o esmeril dulcíssimo do amor-próprio e a sacudir-lhe as teias de aranha irreverentes com um espanador olímpico, feito de grandes caudas de pavão.
Ao contrário. Levantemos a nossa obra com toda a coragem, ao ar livre, na praça pública, sem muros que a vedem e sem granadeiros que a defendam. Batam-na os ventos, crestem-na os sóis, lasquem-na os raios, a ferrugem que a vermine, a lama que a conspurque e os cães que a mordam. E depois de exibida assim durante vinte ou trinta anos a todas as admirações e a todos os insultos - desde as coroas da apoteose até aos coices dos onagros - depois de lhe terem passado por cima o gelo de trinta Invernos e o fogo de trinta Estios, então, e só então, meus amigos, é que poderemos averiguar com segurança se o nosso monumento para a imortalidade era de bronze ou era de zinco, era de mármore ou era de gesso.
Sim, o crítico dos críticos é só ele - o tempo. Infalível e insubordinável. As grandes obras são como as grandes montanhas. De longe, vêem-se melhor. E as obras secundárias, essas quanto maior for sendo a distância, mais imperceptíveis se irão tornando.
Guerra Junqueiro, prefácio à segunda edição de A Velhice do Padre Eterno
quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017
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