segunda-feira, 2 de março de 2020
Online Março - Editorial - Cronovírus
Editorial
Cronovírus
A UNESCO deverá apreciar em Novembro a candidatura da Relojoaria suíça e francesa a Património Cultural Imaterial da Humanidade. Não deixa de ser uma ironia que isso ocorra em 2020, talvez o ano mais dramático para o sector, após a crise do quartzo, dos anos 1980.
Nunca o tecido empresarial suíço esteve tão dividido. Num sector tradicionalmente conservador, fechado, mas que sempre se entendeu a nível patronal quanto a uma estratégia global de médio e longo prazo, os grandes grupos com interesses na relojoaria helvética andam há vários anos a digladiarem-se sem sentido.
Primeiro foi a guerra que o Swatch Group moveu aos concorrentes, ameaçando deixar de lhes fornecer calibres e acusando-os de gastarem mais em marketing do que em investimento verdadeiramente industrial. Com a estagnação dos últimos anos, há calibres a mais e é o próprio Swatch Group que quer agora continuar a vender à concorrência. Entretanto, muitos grupos como o Richemont ou o Kering, investiram fortemente no fabrico de calibres de raiz, uma decisão que não será paga tão cedo.
Depois, houve a guerra dos salões. Há 30 anos, o então Grupo Vendôme, hoje Richemont (dono da Cartier, entre muitas outras marcas) decidiu sair de Basileia, onde há mais de cem anos se realiza a maior feira do sector, para fazer o seu evento em Genebra.
Pelo meio, surge um inimigo de tipo novo – o smart watch e a entrada em cena das gigantes electrónicas. Em 2019, só a Apple, vendeu mais relógios que toda a indústria relojoeira suíça.
Baselworld teve a segunda grande machadada quando o Swatch Group anunciou que já não estaria na edição de 2019. Alegou preços demasiado elevados. E lançou o seu próprio salão – Time to Move. Muitas outras marcas foram deixando Baselworld, que se remodelou totalmente e preparava uma edição 2020 com nova roupagem.
O principal mercado de destino dos relógios suíços, Hong Kong, está em ebulição há mais de um ano e as quebras no consumo de luxo são acentuadas. Entra em cena o novo coronovírus. E a situação de crise no consumo do luxo faz-se imediatamente sentir em mercados tão importantes como China continental ou Japão.
Por razões de saúde pública, as edições 2020 de Time to Move, salão de Genebra e Baselworld foram canceladas. O coronovírus é assim um cronovírus ameaçador.
Não seria tempo da indústria relojoeira suíça voltar aos princípios que a guiaram desde há séculos, tocar a reunir, e apresentar ao mundo respostas conjuntas e capazes de responder à sobrevivência de um sector que poderá vir a ser declarado Património Cultural Imaterial da Humanidade, mas que também corre o risco de passar definitivamente à História?
Já se encontra disponível aqui, aqui ou aqui, para descarregamento grátis, a edição de Maio do Relógios & Canetas online, a mais importante plataforma do seu género em língua portuguesa.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário