Meditações - A marcha do relógio o ritmo dos seus ponteiros

Sofer Há os que dizem que é preciso
Sofrer como se o mundo
Não fosse uma armadilha e cada passo
Um novo passo em falso
Num terreno minado Sofrer
Como se só as lágrimas nos dessem
Um arremedo de mar no seu sabor
A cloreto de sódio. É um lugar-
-comum falar das ágrimas falar
Do sal mas é verdade que sofrer
Por ter um coraçao ou por não ter
Um coração é um lugar-comum
Quando olhas o mar quando regressas
E vês à tua frente atrás de ti
Ainda essa mulher quando admites
Que é preciso sofrer até ao fim
A sucessão dos dias a passagem
Das horas dos minutos dos segundos
A marcha do relógio o ritmo dos seus
Ponteiros garras unhas
Esse tiquetaque tóxico anestésico
Objecto empedernido no interior
Do peito à espera de um
Coração
Vindo de outro planeta mesmo de outra
Galáxia de outro ser
Já nem sequer humano nem sequer real
[…]

Fernando Pinto do Amaral