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quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Um Longines evocativo do Centenário da Aviação Naval em Portugal


Artigo publicado na edição de Inverno 2018 da revista Turbilhão, por ocasião da edição especial Longines dedicada ao Centenário da Aviação Naval em Portugal:

O Centenário da Aviação Naval

Pelo mar e pelo ar

Fernando Correia de Oliveira

Quando, em 2016, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, inaugurou uma estátua bem no centro de Vila Nova da Rainha, Concelho da Azambuja, no Ribatejo, a 50 km ao norte de Lisboa, foram muito poucos os seus habitantes que reconheceram o significado do monumento.

O que estava ali a fazer a representação de um avião? Pois foi ali, exactamente naquele local que foi construído, em 1916, um complexo da Marinha Portuguesa, um aeródromo e escola de pilotagem, de onde saíram os primeiros pilotos de avião militares do país. Dessas instalações não resta, há muito, nada. E a memória colectiva do lugar foi esquecendo por completo que ali tinha nascido a aviação militar portuguesa. Entre os instrutores estava Sacadura Cabral (1881-1924), nome que se iria tornar famoso. A escola de aeronáutica e o quartel adjacente funcionaram até 1920.

O esforço de Portugal em criar um corpo de aviação militar dá-se no contexto da I Guerra Mundial, que começou em 1914. Foi nesse conflito que se assistiu, pela primeira vez, ao uso de aviões, permitindo uma rápida evolução em táctica e combate no ar. Foi em 1915 que o Ministério da Guerra abriu o primeiro concurso entre oficiais da Marinha e do Exército para a formação e obtenção do brevet de pilotos aviadores em França, Inglaterra e Estados Unidos.

Só mais tarde, com a construção das infra-estruturas de Vila Nova da Barquinha e a aquisição das primeiras aeronaves, abre o primeiro curso de pilotagem em Portugal, que funcionou na chamada Escola de Aeronáutica Militar.

Portugal entrou no conflito mundial em 1916 e, a partir de então, os seus portos, navios e vias de comunicação passaram a estar sob ameaça dos submarinos alemães. A utilização de meios aéreos, em articulação com os meios navais existentes, possibilitaria uma maior eficácia na vigilância e defesa dos portos e litoral português.

No início de 1917, Sacadura Cabral, oficial da Marinha, e piloto recém-formado em França, especializado em hidroaviões, apresentou ao Ministro da Marinha uma proposta para a criação de um dispositivo aéreo de vigilância da costa. Na convenção luso-francesa de 21 de Junho de 1917, estabeleceu-se a criação de um Centro de Aviação Marítima (CAM) em São Jacinto. Aveiro, sob responsabilidade da Marinha Francesa, competindo a Portugal a criação dos restantes dois: em Lisboa e no Algarve (este último não chegaria a ser activado). A 28 de Setembro de 1917 é criado o Serviço e Escola de Aviação da Armada. Nascia assim, já no terreno, a aviação militar em Portugal.

O Centro de Aviação Marítima de Lisboa foi instalado na Doca do Bom Sucesso, tendo iniciado a sua actividade operacional em Dezembro de 1917, com a amaragem dos dois aparelhos “FBA” tipo B, hidroaviões que a Aviação Naval possuía à data.

Ao longo do ano de 1918, até ao final da Grande Guerra, o Centro realizou patrulhas de reconhecimento ao longo da costa e exercícios conjuntos com unidades navais, em busca de sinais dos temíveis submarinos U-boat alemães. O Centro contava apenas com os dois aviões referidos e com quatro pilotos.

O segundo Centro de Aviação Marítima, em São Jacinto, iniciou actividade em Maio de 1918, sob direcção da Marinha Francesa. Tinha à sua disposição seis aparelhos Donnet Denhaut e um conjunto de pilotos e outro pessoal militar francês. No final do conflito, em 1918, o Centro de Aviação Marítima de Aveiro foi cedido à Marinha Portuguesa.

Com o projecto da primeira travessia aérea do Atlântico Sul, realizada com sucesso em 1922 por Gago Coutinho (1869 – 1959) e Sacadura Cabral, dois oficiais desta Arma, a aviação naval ganhou grande admiração e notoriedade no país, mantendo vivo o interesse de manter a capacidade aérea da Marinha.

A iniciativa de ligar pelo ar as costas do continente europeu e americano, por cima das águas do Atlântico Sul, surgiu no âmbito das comemorações da independência do Brasil. Sacadura Cabral foi o autor da ideia.

Do ponto de vista técnico, o maior problema que se apresentava era o da navegação sem pontos de referência. O seu companheiro de viagem, Gago Coutinho desenvolveu processos, inventou instrumentos, baseado na experiência que tinha na navegação marítima. Convidado por Sacadura Cabral, desde 1919 que Gago Coutinho vinha desenvolvendo novas técnicas de navegação aérea. Inventou um novo sistema de horizonte artificial aplicado ao sextante, permitindo a sua utilização eficaz a bordo de aeronaves. Isso foi crucial para a navegação aérea.

Depois de um primeiro teste com esses métodos de navegação, em 1921, em viagem de sete horas e meia num hidroavião, entre Lisboa e Funchal, ocorre a epopeica ligação Lisboa / Rio de Janeiro, realizada no Lusitânia, outro hidroavião, entre 30 de Março e 17 de Junho de 1922, ano do primeiro centenário da independência do Brasil.

A viagem, com uma extensão aproximada de 4.350 milhas náuticas, foi um grande feito para a época pois a viagem decorreu praticamente sempre sobre o mar, e pela primeira vez foram empregues na navegação aérea os processos de determinação de posições sucessivas, usados na navegação marítima.

Utilizou-se para o efeito, além da bússola, cartas náuticas e tábuas de logaritmos, bem como o chamado sextante português, que com o auxílio de uma bolha de ar, dá a altura do sol por meio de um horizonte artificial, o tal método desenvolvido por Gago Coutinho.

Do ponto de vista relojoeiro, é o próprio Gago Coutinho que nos esclarece, no relatório da viagem, apresentado no ano seguinte: “Na navegação astronómica empregou-se, como a bordo dos navios, um cronómetro médio, que dá a hora de Greenwich; e levávamos também um bom contador médio. Na previsão de observações astronómicas de noite, tínhamos mais um cronómetro regulado para o tempo sideral de Greenwich”.

Tinha sido conquistado, pelo ar, o Atlântico Sul. Quanto ao Atlântico Norte, foi Charles Augustus Lindbergh quem o primeiro atravessou, em voo solitário e sem escalas, ligando em 1927 Nova Iorque a Paris.

Desde 1925 que, com a criação da Escola de Aviação Naval, primeiro na Doca do Bom Sucesso, depois em Aveiro, foi possível formar pilotos portugueses em território nacional. Esse centro funcionou até 1952.

Os valiosos contributos que a Aviação Naval prestou no salvamento de sobreviventes de navios afundados durante a II Guerra Mundial, bem como na salvaguarda da soberania nacional nas águas territoriais, foram importantes argumentos para a manutenção da capacidade áerea na Marinha Portuguesa.

Em 1952 procede-se à organização geral da aeronáutica militar e, após 30 anos de actividade, a Aviação Naval era extinta enquanto meio operacional da Marinha, passando a integrar a estrutura daquele que viria a ser o terceiro ramo das Forças Armadas nacionais, a Força Aérea Portuguesa.

Ao longo dos seus 35 anos de existência, entre 1917 e 1952, os aparelhos utilizados pela Aviação Naval reflectem a rápida evolução da indústria aeronáutica militar. Durante esse período entraram ao serviço 34 tipos diferentes de aeronaves, desde as primeiras com casco de madeira e asas de tela, até às que utilizam as mais modernas ligas metálicas. O mesmo se passou em relação à potência dos motores, sistemas de navegação e comunicação e armamento.

Só a partir de 1993, com a criação da Esquadrilha de Helicópteros, a Marinha Portuguesa volta a operar com meios aéreos. Foi no âmbito dp Centenário da Aviação Naval e, ao mesmo tempo, da Aviação Militar em Portugal, que foi criada a Edição Especial Longines evocativa da efeméride. Trata-se de um cronógrafo automático, limitado a 100 exemplares, com caixa de aço gravada no verso com a âncora e as asas, o símbolo da Aviação Naval portuguesa.





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