Est. June 12th 2009 / Desde 12 de Junho de 2009

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domingo, 19 de outubro de 2025

Portugal e o Tempo - apresentação na quarta-feira, 22 de Outubro

A Fundação Francisco Manuel dos Santos convida-o a assistir à apresentação do ensaio Portugal e o Tempo, no dia 22 de outubro (quarta-feira), às 18h30, na sala Âmbito Cultural (Piso 6) do El Corte Inglés, em Lisboa.

Até que ponto a língua portuguesa reflete a relação que temos com o tempo enquanto medida cronológica? Existirá um «tempo português»? De onde vem a nossa má relação com a pontualidade? Será a história da relojoaria nacional reveladora do nosso modo de viver o tempo?

Uma conversa com o autor, jornalista e investigador Fernando Correia de Oliveira, o cientista Carlos Fiolhais e a socióloga Luísa Lima para perceber se existe uma forma especificamente portuguesa de encarar e viver o tempo cronológico – e, existindo, o que a caracteriza. Da tradição relojoeira à preservação do património temporal, passando pelos monumentos mais simbólicos, conta-se a história de Portugal através das horas.

Sabia que… ?

Será que existe um “tempo português”? Há línguas que têm palavras próprias para designar o tempo cronológico e o tempo meteorológico (time e weather, em inglês, por exemplo). Em português, há uma única palavra para as duas realidades. Os ingleses têm clock para relógios grandes e watch para relógios de bolso ou de pulso. Os franceses usam, respectivamente, horloge ou montre. Em português, mais uma vez, uma única palavra para abarcar conceitos tão diferentes. A pobreza linguística reflecte a deficiente relação que Portugal tem mantido com o Tempo.

Do que trata este livro?

Abordando de forma multidisciplinar e cronológica a maneira como o Tempo tem sido vivido, esta obra cobre um vasto arco, que vai dos alinhamentos megalíticos à actualidade, passando pelos relógios de sol introduzidos pelos romanos e pelas encomendas quase sempre faustosas de relojoaria importada, reflectindo mais a preocupação de aparato do que de pontualidade.

Sabia que Portugal tem um dos mais importantes e antigos cromeleques da Europa?

Os alinhamentos megalíticos constituídos por pedras oblongas (menires) são chamados de cromeleques. A sua construção exigiu um esforço colectivo considerável, o espaço onde se situam terá sido palco de cerimónias do domínio do sagrado, e em determinadas alturas do ano. Até porque o alinhamento desses cromeleques permite, ainda hoje, assinalar através da sombra ou da luz projectadas os Solstícios e os Equinócios. Os cromeleques são calendários, que continuam a funcionar.

Em Portugal, há vários conjuntos dessas pedras alinhadas, sendo o mais conhecido o Cromeleque dos Almendres, a 12 km a poente de Évora (almendres, por semelhança das pedras cm amêndoas).

Construído a partir dos finais do VI milénio a.C., ou dos inícios do seguinte, desenvolveu-se até começos do III milénio a.C.. Descoberto modernamente apenas em 1964, é considerado Imóvel de Interesse Público desde 1974. É o maior conjunto de menires estruturados da Península Ibérica e um dos mais importantes da Europa.

Sabia que Egitânia (Idanha-a-Velha), teve um relógio de sol monumental, único no seu género no território que é hoje Portugal?

Os primeiros relógios de sol terão entrado através da conquista romana. Mas é grande a raridade e escassez de referências a esse tipo de artefactos. O exemplar mais interessante é um que não foi até hoje descoberto, mas cuja existência está documentada numa inscrição.

Estamos a referir-nos a uma lápide romana, de 16 a.C., trazida de Idanha-a-Velha por um antigo Conservador do Museu Etnológico Português (hoje Museu de Arqueologia). Diz-nos Leite de Vasconcelos, em 1915, que se tratava da mais antiga inscrição romana no espólio do museu. Nela se lê “(h)orarium”, e, segundo ele, poderá ter figurado num edifício construído de raiz para albergar um relógio de sol, na praça ou “forum” da capital dos Igaeditani. A norte do Tejo, a hoje Idanha-a-Velha (Civitas Igaeditanorum), a capital da Igitânia, revelou-se como o centro romano mais rico em inscrições latinas (mais ou menos 200), traduzindo a importância da urbe nas rotas comerciais da região no século I da nossa era.

A inscrição, uma das mais antigas que se conhecem em território da Lusitânia, diz-nos que um tal Q. Iallius Augurinus mandou construir, à sua custa, um “(h)orarium” (relógio), que ofereceu à cidade de Igaeditanis.

Sabia que a Sé de Lisboa terá tido o primeiro relógio mecânico do país?

Em 1377 regista-se o primeiro relógio mecânico em Portugal, equipando a Sé de Lisboa e da autoria de um “mestre João, francês”. Terá sido pago em partes iguais pelo rei, D. Fernando I, pelo Cabido da Cidade e pelos homens bons do burgo. Não tinha mostrador, “batia” apenas as horas, não as mostrava.

Sabe o que era o sino de correr, de colher, ou de colhença?

Em 1395 há a primeira referência conhecida em Portugal, num documento do município de Lisboa, ao “sino de correr”, “sino de colher” ou “sino da colhença”. Depois do seu toque, até a manhã clara, deviam estar fechadas as tavernas. Era o último dos sinos da cidade a soar, depois do sino da Oração ou da Trindade, sinal que ao anoitecer se dava para rezar as três Ave Marias da saudação angélica. Depois do toque de “colher”, eram rigorosamente castigados os mouros e judeus que fossem encontrados fora dos seus bairros, que tinham as portas cerradas todas as noites pelas autoridades municipais. Accionados manualmente no início, a partir de dada altura, esses sinos passaram a ser accionados através de mecanismos relojoeiros.

Sabia que o primeiro relógio mecânico de fabrico nacional foi feito por um franciscano?

“No ano do Senhor de 1478, sendo vigário provincial frei João da Póvoa: requereu-lhe um frade leigo que se chamava Frei João da Comenda, natural de São Pedro do Sul, morador nessa altura em Orgens, perto de Viseu, licença para construir um Relógio de Rodas de Ferro. Porque o engenho lhe dizia que o poderia fazer bem [...]”. O relógio de Orgens nunca teve mostrador, era dos que apenas “batia” as horas. João da Comenda terá feito mais uns doze, para outros tantos mosteiros da ordem.

Sabia que deverá ter sido um comerciante de Nuremberga a introduzir os relógios de bolso em Portugal?

Em 1507, morre em Lisboa Wolfgang Behaim, comerciante, pertencente a uma família bem conhecida no trato entre Portugal e a os territórios que são hoje a Alemanha. No seu testamento são mencionados “Schlagurlein” – relógios despertadores, os famosos “ovos de Nuremberga”. É a primeira referência que se conhece deste tipo de instrumentos portáteis e mecânicos em Portugal, inventados poucos anos antes por Peter Henlein, um relojoeiro da Floresta Negra.

Sabia que os portugueses, sobretudo através do Padroado do Oriente, foram os introdutores do relógio mecânico na China ou no Japão?

São Francisco Xavier, ao serviço do Padroado Português do Oriente, tenta entrar no Japão e, em 1551, entre vários presentes para impressionar os senhores locais, leva um relógio, que oferece a Yoshitaka Ohuchi, daimio (governador) de Suo – o nome antigo da parte mais oriental da que é hoje a Prefeitura de Yamagushi.

Os portugueses também foram responsáveis pela introdução do relógio mecânico na China.  Na obra Do Oriente Conquistado, o padre Francisco de Sousa relata que, em 1582, os jesuítas Miguel Rugieri e Francisco Pacio, residentes em Macau e ao serviço do Padroado português, fazem chegar ao vice-rei de Cantão a informação de que dispõem de “uma máquina de aço toda de rodas por dentro, que continuamente se moviam por si mesmas, e mostravam por fora todas as horas do dia e da noite, e ao som de uma campainha dizia o número de cada uma delas”. A 27 de Dezembro, dá-se um momento histórico: Rugieri e Pacio fazem o que se pensa ser a introdução do primeiro relógio mecânico na China. Os relógios iriam abrir, como presentes, as portas da corte imperial aos jesuítas, em Pequim. Os jesuítas portugueses Gabriel de Magalhães e Tomás Pereira fabricaram mesmo relógios na capital chinesa, para gáudio do Imperador e da sua corte.

No Japão, o irmão leigo e jesuíta português João Rodrigues, homem de múltiplos talentos, ajuda a fundar em 1600 uma escola vocacional, o “Seminário”, em Shiki, na ilha de Amakusa, Prefeitura de Nagasaki. Nessa escola, Rodrigues (“Tsusu”, o nome por que era conhecido entre os gentios) dirige um curso de relojoaria, ensinando aos jovens nipónicos a fazerem igualmente órgãos e equipamento astronómico. Isso foi o início da manufactura de relógios mecânicos no Japão.

Sabia que Portugal tem um dos maiores conjuntos carrilhões/relógios do mundo?

Em 1750, conclui-se o Convento de Mafra, mandado construir por D. João V. Do ponto de vista relojoeiro, as duas grandes torres, que sobressaem nos 220 metros de fachada, foram equipadas com máquinas, ligadas a sistemas de carrilhões dos maiores que alguma vez se construíram no mundo. O carrilhão que se situa na torre norte veio de Liège, da oficina de Nicolau Levache, e o da torre sul de Antuérpia, da oficina de Willem Witlockx. As peças dos relógios e os sinos foram acompanhados, desde os locais de origem até Mafra, por uma equipa de operários especializados daquelas oficinas, para proceder à sua montagem. Ficaram por Mafra durante mais de um ano.

O relógio da torre Norte, conhecido como “O Romano”, tem mostradores de apenas seis horas. Foi munido de uma complicação: um sistema de despertador automático, fazendo soar sinos diariamente, ao nascer e ao pôr do Sol. O da torre Sul, conhecido como “O Português”, tem mostradores de doze horas. A manutenção do gigantesco conjunto relógios / carrilhões de Mafra tem sido errática, até hoje. Nos últimos cem anos, nunca ele esteve a funcionar em pleno.

Sabia que houve uma Real Fábrica de Relojoaria no complexo Rato / Amoreiras?

Por iniciativa do Marquês de Pombal, funda-se em Lisboa, na zona das Amoreiras, em 1765, e com capitais públicos, uma Real Fábrica da Relojoaria, a primeira do género em Portugal, e no âmbito do esforço de industrialização prosseguido por Sebastião José. À sua frente está um francês, Claude Berthet. Em 1770, Antoine Durand, de novo um francês, passa a ser o responsável pela Real Fábrica de Relógios. Antoine Durand assina em 1775 novo contrato de exploração por mais oito anos da Real Fábrica de Relógios. Em caso de morte, a concessão passaria para um seu filho. Uma cláusula do documento prevê que “Sua Majestade haja por bem mandar proibir a entrada a todos os relógios vindos de fora do Reino”. A fábrica deu sempre prejuízo e fecharia anos mais tarde, falida.

Sabe o que foi o Balão do Arsenal?

O Diário do Governo publica em 1858 a seguinte nota: “Achando-se actualmente colocado no plano do meridiano do Observatório Astronómico da Marinha o seu instrumento de passagens, anuncia-se a bem do serviço de cronómetros da marinha de guerra e mercante, e dos relógios públicos e particulares desta capital, que da data do presente anúncio em diante se indicará todos os dias no referido Observatório, por meio da rápida queda de um balão, o rigoroso instante em que a pêndula do mesmo Observatório marcar exactamente uma hora média”. A queda do balão era acompanhada de um sinal sonoro. O instrumento ficou conhecido como o Balão do Arsenal, dada a sua localização, entre o Cais do Sodré e o Terreiro do Paço, em Lisboa. Em 1885, atentas à “vergonha nacional” que constitui o seu mau funcionamento, as autoridades substituem o primeiro Balão do Arsenal por um outro, mais sofisticado. O novo aparelho foi construído sob a direcção do oficial da Armada e engenheiro hidrógrafo Fredrico Augusto Oom (1830-1890), primeiro director do Real Observatório Astronómico de Lisboa (Tapada da Ajuda).

O Balão do Arsenal deu o seu derradeiro sinal à uma hora do dia 31 de Dezembro de 1915. Por iniciativa do Comandante de Marinha António Estácio dos Reis, especialista em história náutica, uma réplica do Balão do Arsenal foi erigida em 2018 no local, reproduzindo diariamente a sua queda, às 13h00.

Sabe quem foi Augusto Justiniano de Araújo?

O Diário Popular de 7 de Dezembro de 1883 diz, numa local: “No dia 4, às 7 da noite, ficou completo o assentamento do relógio do arco da rua Augusta. Este relógio é de construção nacional e do estilo do século XVIII. Era do antigo convento de Jesus [hoje Academia de Ciências] e não estava organizado para indicar as horas para o lado da rua” (ou seja, não tinha mostrador). A reparação do relógio esteve a cargo de Augusto Justiniano de Araújo, que viria a ser o fundador da Escola de Relojoaria da Casa Pia.

Sabe quem foi Giuseppe Fontana?

O relojoeiro suíço Giuseppe Silo Domenico Fontana (1840 – 1876, José Fontana), líder no movimento sindical mundial, chega a Lisboa por volta de 1865. Introduz os ideais cooperativistas e socialistas no país. É, em 1875, fundador do Partido Socialista Português.

Sabia que “o relógio mais complicado do mundo” foi comprado por um português?

António Augusto de Carvalho Monteiro (1848 – 1920), o “Monteiro dos Milhões”, era um grande coleccionador, nomeadamente de relógios. Encomendou à casa Le Roy, de Besançon, França, o relógio de bolso mais complicado que à altura se pudesse fazer. A tarefa de construção do novo movimento coube ao relojoeiro Charles Piquet. A peça esteve na Exposição Universal de Paris de 1900, onde ganhou o grande prémio do certame. Com 71 mm de diâmetro e 228 gramas de peso, o “Leroy 01” tem 24 diferentes complicações relojoeiras. A peça só chega a Lisboa em 1904, trazida pelo próprio rei D. Carlos, que passara por Paris. Em 1937, os herdeiros de Carvalho Monteiro venderam o relógio a um joalheiro português. Posteriormente, foi adquirido pela cidade de Besançon, que o mantém no seu museu de Relojoaria.

Sabe quem foram José Pereira Cardina e Manuel Francisco Cousinha?

Dois nomes dominam durante o século XX a relojoaria grossa nacional: José Pereira Cardina (1882-1953) e Manuel Francisco Cousinha (1894 – 1961).

Natural da freguesia do Juncal, concelho de Porto de Mós, Cardina chega à Nazaré por volta de 1909, com 27 anos. Aluga no centro da vila, na rua, um pequeno cubículo, onde instala a sua oficina de reparação de relógios de bolso. Sem formação específica, apenas tendo como arma a intuição e a observação, Cardina começa por “subir” na proporção, analisando, reparando e mesmo fazendo relógios de sala, copiando depois de cabeça, sem esquemas ou desenhos, um desses exemplares de torre, fazendo ele próprio todas as peças. A primeira grande encomenda que Cardina consegue obter terá sido a do relógio para a Igreja de Nossa Senhora da Nazaré, no Sítio. A casa Cardina resistiu apenas mais alguns anos à sua morte. As suas peças encontram-se espalhadas por dezenas de igrejas e câmaras municipais de todo o país.

Quanto a Cousinha, era da região de Arganil. Quando Portugal entra na I Guerra Mundial, Cousinha faz parte do Corpo Expedicionário Português (CEP) que segue para França. Terminada a campanha militar, Cousinha foi descansar para a pequena cidade de Morez, no Departamento do Jura, região da França que faz fronteira com a Suíça. Morez sempre foi uma zona de tradição relojoeira. Com a estadia na região, Cousinha aprofundou os conhecimentos quase instintivos que até aí tivera sobre relojoaria. Regressado a Portugal, funda em 1930 a firma A Boa Construtora – Fábrica Nacional de Relógios Monumentais, num barracão em pleno coração de Almada. A empresa cresceu, construiu uma grande fábrica, mas, com a agitação social após o 25 de Abril de 1974, e havendo uma inadaptação da produção às novas exigências do mercado (relógios electrónicos, com circuitos integrados, concorrência asiática muito forte), a empresa vai à falência.

Quais foram as grandes mudanças estruturais no Tempo Português?

A 22 de Agosto de 1422, no reinado de D. João I, é publicada a lei que altera em Portugal a era hispânica, de César, ou de Augusto, iniciada em 38 a.C., para a era de Cristo (de 1460 passou-se para 1422, Anno Domini).

Em 1583, Portugal passa a reger-se pelo Calendário Gregoriano, numa reforma decretada no ano anterior pelo papa Gregório XIII e que vem substituir o Calendário Juliano. Assim, ao 5 de Outubro, uma quinta-feira, seguiu-se sexta-feira, 15 de Outubro.

Só com a República, e pelo decreto-lei de 24 de Maio de 1911, subordina-se a hora legal de todo o território português ao meridiano principal de referência, de acordo com a Convenção de Washington de 1884. A partir de 1 de Janeiro de 1912, todos os serviços públicos e particulares, possuidores de relógios internos e externos, passam a ser regulados e acertados pela hora legal estabelecida nos termos anteriores, cabendo-lhes o dever de tornar pública a informação horária. Foi nesta data que os relógios nacionais foram adiantados 36 minutos 44 segundos e 68 centésimos, a diferença de graus convertidos em tempo entre os meridianos de Greenwich e de Lisboa.

Em 1916, a chamada Hora de Verão é adoptada pela primeira vez em Portugal, devido às restrições provocadas pela I Guerra Mundial e com o intuito de poupar carvão. Consistiu no adiantamento dos relógios de uma hora, durante os meses de Primavera e Verão, mas este avanço chegou, por várias ocasiões, a ser de duas horas.

Uma quinta mudança estrutural acaba de ocorrer. Em 2023, depois de século e meio a ser o depositário da hora legal, numa tradição mundialmente seguida de relação umbilical entre astronomia, medição e emissão do tempo, o Observatório Astronómico de Lisboa, entretanto feito espaço museológico, e por decisão governamental, deixa de ter esse papel. Que passa para o Instituto Português da Qualidade, até agora apenas o depositário do segundo padrão.

Qual o estado da relojoaria pública nacional?

A relojoaria férrea nacional, na sua esmagadora maioria, ou está parada ou foi electrificada. Clero e seus auxiliares (sacristãos) envelhecidos, sem força para subir escadas em locais íngremes ou para dar corda às máquinas, foram o quadro propício à hecatombe. A insensibilidade da Igreja (e do poder local) em preservar peças valiosas de arqueologia industrial fomentaram o desastre. Máquinas velhas de séculos foram, nos anos 1980 e 1990 deitadas para o lixo ou vendidas para o estrangeiro, em troca de circuitos electrónicos que, comandados a partir das sacristias ou dos andares térreos das torres, podem ser accionados, lançando para o ar menus variados de melodias. Mudos os sinos, apareceram em sua substituição os megafones.

Todo o esforço de introduzir no quotidiano nacional hábitos de pontualidade, através de marcadores de tempo públicos ou privados precisos, não surtiu efeito. O relógio foi sempre encarado mais como objecto de aparato, de ostentação, do que como verdadeiro regulador, O paradigma disso, os dois relógios do Convento de Mafra, quase sempre parados. Ou o relógio da Hora Legal, ao Cais do Sodré, que nunca esteve certo.

Uma importante peça de arqueologia industrial, um relógio monumental, assinado José da Silva Mafra, de 1796, na Torre do Galo, junto ao Palácio da Ajuda, mantém-se há décadas ao abandono, em risco de ruir.

Em 2024, não há qualquer entidade ou relógio público que emitam a Hora Legal em Portugal.

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