sábado, 7 de dezembro de 2019
E para o Natal... Mecânica do Tempo
A imaterialidade do Tempo adquire consistência no quotidiano através das máquinas que o medem – os relógios.
Desde o aparecimento da Relojoaria Mecânica, no final do séc. XIII e início do séc. XIV, que muitos autores, nomeadamente de textos religiosos, sentiram a tentação de comparar o comportamento das engrenagens dos medidores do tempo com o Universo. E Deus foi chamado de Supremo Relojoeiro, criador e guardião da Mecânica Celeste, tão perfeita na sua Harmonia de Esferas. Os corpos celestes com os seus ritmos exactos, eram, eles próprios, inspiradores dessas mesmas engrenagens, que os representavam em miniatura, através de relógios astronómicos. Na Terra, os reis deveriam governar segundo as regras do “relógio” de Deus e serem, eles próprios, “mestres relojoeiros” das sociedades que tinham ao seu cuidado.
A Mecânica do Tempo – Relógios da Coleção Medeiros e Almeida sustenta a imaterialidade do Tempo em 12 Pilares. De todo o acervo, escolhemos 12 peças que considerámos dignas de serem destacadas. Podiam ser muitas mais. Mas o 12 é intrinsecamente uma grandeza relojoeira – presente nos mostradores, divide as 24 horas em dia e noite.
São esses 12 pilares as peças de abertura de outros tantos capítulos, eles próprios abordando de forma temática – não cronológica – vários campos onde o Tempo, omnipresente, se pode apreciar, em múltiplas materialidades. Traduzidas em cada um deles com outras peças da colecção.
Dá-se início a esta viagem de séculos com a análise do mundo de Abraham-Louis Breguet, pois a colecção é considerada uma das melhores do mundo com exemplares deste autor ou da sua manufactura.
Analisam-se os primórdios da percepção humana do tempo, desde a pré-história, mas sobretudo a partir do momento em que os relógios passam a ser mecânicos.
Breguet era suíço, mas a sua actividade passou-se quase inteiramente em França. Um dos capítulos é dedicado à Escola Francesa, com incursões na produção helvética vizinha.
Do ponto de vista estético, pode falar-se de um “confronto” entre a Escola Francesa e a Escola Inglesa – os primeiros dão mais importância à forma. Os segundos, ao conteúdo. É uma visão redutora, ambos países produziram mestres relojoeiros e respectiva obra de excepção.
Mesmo que imaterial, o Tempo tem profusa representação e múltiplas formas de leitura. A Estética do Tempo convoca para os Métiers d’Art, para o cruzamento da relojoaria e da arte puramente mecânica com os ofícios que as tornam ricas em formas e materiais utilizados. Há toda uma produção de relojoaria que claramente serve os objectos de adorno ou decoração dos espaços, secundarizando os relógios que neles se integram. Os Relógios de Aparato são para impacto visual. Além disso, dão horas e minutos…
A relação entre a Relojoaria e a Astronomia é forte. A primeira ajudou a segunda a avançar, a segunda pressionou a primeira para ser cada vez mais exacta. Numa pareceria onde o tempo astronómico deu das mais belas complicações relojoeiras, como os calendários perpétuos, as equações do tempo, as fases de lua…
A medição do tempo em horas e minutos tem, no Ocidente, raízes religiosas. Mas o eterno devir sente-se melhor na queda da areia de uma ampulheta ou da água de uma clepsidra, no gastar de uma vela graduada, de um pau de incenso a ser queimado. A colecção tem peças onde o escoar do Tempo se vê.
Imaterial, o tempo tem, no entanto, voz. Há todo um mundo rico, complexo, raro, nas chamadas complicações sonoras. O bater de horas e quartos; o ouvir a pedido horas, minutos, quartos; ou, à passagem, alarmes, melodias; o som de pássaros cantores, autómatos, caixas de música. Tudo isso implica mecanismos complexos, elaborados, que vão muito para além das prosaicas indicações de horas e minutos.
A navegação, por mar ou pelo ar, sempre precisou de medidores de tempo o mais exactos possível. Tal como com a Astronomia, também aqui a Relojoaria foi sendo pressionada pelas necessidades a produzir peças cada vez mais resistentes, fiáveis. E, com a globalização do mundo, a dar aos viajantes indicações da hora não apenas no local onde se encontram, mas em dois, três ou mesmo todos os fusos horários.
Há um Tempo português? Pensamos que sim. Ao longo dos séculos, houve relojoeiros portugueses que produziram relógios de torre, de caixa alta ou de mesa. Há poucos exemplos de relógios de bolso, nenhum de pulso. Mas a colecção tem exemplares que traduzem as relações de importação, de encomendas especiais, de exemplares que foram mesmo feitos no país, a começar pela pombalina Real Fábrica de Relojoaria.
Finalmente, o Tempo privado de António e Margarida Medeiros e Almeida. São os relógios que o casal usou ao longo da vida, ou que esteve no seu quotidiano mais prosaico. Mas, sempre, com apontamentos de excepcional qualidade.
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