segunda-feira, 14 de outubro de 2019
Viagem ao tempo da mansarda ou um déjà vu com um quadro de Eduardo Malta
Foi no Folio 2019. Intensa sensação de déjà vu, este fim-de-semana, ao subir as escadas do Museu Municipal de Óbidos e depararmo-nos com este quadro de Eduardo Malta.
Durante 28 anos, de 1954 a 1982, fomos, tal como um outro Fernando, "o da mansarda". Vivemos então no último piso do nº 3 da Rua Serpa Pinto, ao Chiado, um 5º andar com sotão de grande pé direito e pequenas janelas para o Tejo, de onde vislumbravamos cacilheiros e cardumes de golfinhos. E onde, na adolescência, ali criámos uma espécie de boite...
Na porta em frente, o Ginásio Clube Português onde, a partir dos 4 anos, entrávamos já equipados, vindos de casa, para as aulas dos lendários professores Santos Vieira e Ângelo Caruso.
No quarto andar, eram nossos vizinhos uma família de timorenses, mãe e quatro irmãos - Júlio, Raul, Virgínia e Eugénia. Esta última, escultural, era bailarina no São Carlos, no tempo do Francis; à noite, actuava no Verde Gaio, ao lado da Cervejaria Trindade, um projecto de António Ferro. E ainda tinha outro emprego - era modelo de Eduardo Malta, que vivia na vizinha Vítor Cordon e tinha atelier no então Museu Nacional de Arte Contemporânea, na Serpa Pinto, de que foi o primeiro Director, até à sua morte, em 1967.
Infância passada pois entre corpos semi-nus, nos bastidores do São Carlos, nos camarins dos bailarinos, para onde a Eugénia nos levava todos os dias; ou no atelier de Eduardo Malta. Fomos desenhados por ele umas quantas vezes. A lápis, recordamos um pequeno esboço connosco num cavalinho de pau (onde parará?). E, claro, havia este quadro, de mulher sem nome, que ele não terá vendido (?). Com traços e cores que nunca mais deixaram de nos acompanhar.
A visão desta mulher desenhada por Eduardo Malta levou-nos instantaneamente ao mundo da Serpa Pinto, que os pais acabariam por vender, assustados com o incêndio do Chiado, em 1988.
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