[...] pouco a pouco a noite ia caindo. Tinha-se já apagado a última cambiante do poente e sobre
as gargantas dos montes passavam subtilmente as
primeiras névoas, alvadias e ténues. A medida que
a treva se condensava, decresciam os ruídos em
todo o horizonte, acentuando-se cada vez mais a
melopeia sonolenta do rio nos açudes. Perpassavam
pelo ar as aves para os ninhos. Bandos de pombos,
como flocos voláteis de arminho, cortavam em
voos mansos a profundidade calma do céu,
demandando os pombais e os povoados, onde se
acolhessem da noite que vinha caindo. Revoadas de
perdizes e de tordos passavam por ali alegremente,
num chilrear sonoro, caindo de chofre sobre o
monte, a esconderem-se nos estevais e nas urzes.
Pelas ervagens secas rastejavam apressados os
répteis, e sob os tojais bravios a lebre buscava a
cama...
E tudo tinha ninho – pombas que voavam e
perdizada sonora, quem passava no ar e quem
rastejava no monte, lagartos, sardões, cobras, toda a
colónia vagabunda de répteis e de aves, que passou
alegremente o seu dia, e se ia recolher agora para
recomeçar dia amanhã...
Trindade Coelho, Os Meus Amores
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