sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Meditações - horas monótonas, brasa que se extingue

É certo: cada ano que passa é um laço que nos prende e quanto melhor conheço a tua alma mais me purifico ao seu contacto. Não só fazes parte do meu ser, mas da minha consciência. Chego às vezes a supor que és tu a minha consciência. Por isso esta separação vai ser dolorosa, ainda que eu creia que nos tornaremos a encontrar noutro mundo melhor. Não decerto para vivermos as horas que passámos juntos à beira do lume, penetrados um do outro e unidos pelo silêncio, mas numa vida superior que antevejo e numa paz mais profunda. Ainda assim tenho pena. Tenho pena das horas monótonas que correm – do tempo que passa – da brasa que se extingue...

Raul Brandão, Memórias, O SILÊNCIO E O LUME, Dezembro de 1924

2 comentários:

  1. Que belo naco de prosa
    que não podemos deixar
    de crismar de primorosa
    sem contudo exagerar!

    JCN

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  2. Horas passadas ao lume
    de mãos dadas à lareira
    ficaram como um perfume
    para a nossa vida inteira!

    JCN

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