quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014
Luxo e Alta Relojoaria - Conceitos e Formas - comunicação a participantes em Seminário da Universidade Católica
Estação Cronográfica proferiu ontem à noite, de 4 de Fevereiro, uma palestra - Luxo e Alta Relojoaria - Conceitos e Formas - a participantes no seminário sobre esta temática que está a decorrer na Universidade Católica, em Lisboa.
Para leituras mais aprofundadas, veja aqui.
Comunicação Alta Relojoaria 04.02.14
A indústria relojoeira suíça é o terceiro maior exportador do país, depois das máquinas-ferramentas e da indústria farmacêutica.
Em meados dos anos 1970, a indústria relojoeira suíça estava moribunda, tendo perdido a revolução do quartzo para o Japão e sendo fortemente afectada pela crise económica mundial então ocorrida (os choques petrolíferos).
Quarenta anos depois, após uma reestruturação total, a indústria relojoeira suíça é uma das mais pujantes do país, quebrando ano após ano recordes de valor na exportação. Cerca de 95 por cento do que produz é para exportação. Falemos dos principais players neste sector.
Desde logo, o maior grupo de luxo do mundo, o LVMH, fundado em 1987, como resultado da fusão entre as empresas Moët Hennessy e Louis Vuitton. O seu Presidente é o francês Bernard Arnault. Nos relógios e jóias, tem as marcas Louis Vuitton, Bulgari, Chaumet, De Beers Diamond Jewellers, FRED, Hublot, TAG Heuer e Zenith. O histórico Jean-Claude Biver acaba de ser nomeado para presidir ao segmento relojoeiro. Voltaremos a esta personalidade.
Depois, temos o maior grupo de luxo do mundo em termos de relojoaria, o Richemont Group (antigo Grupo Vendôme). No segmento relojoeiro e joalheiro, tem Cartier, Montblanc, Van Cleef & Arpels, A. Lange & Söhne, Baume & Mercier, IWC, Jaeger-LeCoultre, Officine Panerai, Piaget, Roger Dubuis e Vacheron Constantin. Foi fundado em 1988 pelo sul-africano Johann Rupert. Compagnie Financière Richemont SA é a sexta maior empresa em capitalização bolsista na bolsa Suíça. É também o terceiro conglomerado de luxo mundial.
Na indústria do luxo, e entre o LVMH e o Richemont Group, em segundo lugar, está o grupo Kering (ex-PPR Pinault-Printemps-Redoute). É o mais antigo dos três. Foi fundado em 1963 pelo francês François Pinault e é actualmente dirigido pelo filho, François-Henri Pinault. NO segmento dos relógios e jóias, tem a Gucci, Boucheron, Girard-Perregaux e JeanRichard.
Depois, temos o maior grupo de relojoaria do mundo – o Swatch Group. Tem uma forte base industrial – nasceu de fusões, no auge da crise do quartzo, numa estratégia liderada por Nicolas Haiek. Fornece quase em regime de monopólio algumas peças essenciais para todo o sector (voltaremos ao assunto), tem 18 marcas e as redes de retalho Tourbillon e Hour Passion. É líder mundial na tecnologia de medição de tempos desportivos, está na indústria de ponta no desenvolvimento de novos materiais compósitos. As marcas: Breguet, Harry Winston, Blancpain, Glashütte Original, Jaquet Droz, Léon Hatot, Omega, Longines, Rado, Union Glashütte, Tissot, Balmain, Certina, Mido, Hamilton, Calvin Klein watches + jewelry, Swatch, Flik Flak. Algumas das empresas subsidiárias: ETA (calbres), Nivarox-FAR (espirais), Comadur (novos materiais), Oscilloquartz (calibres de quartzo), Swiss Timing (cronometria desportiva), além de fabricantes de caixas, mostradores, ponteiros, vidros...
Finalmente, há os grandes independentes, com a Rolex e a Patek Philippe à cabeça, mas onde estão também a Chopard ou a Audemars Piguet.
O Swatch Group, o Richemont Group e a Rolex representam 45,8 por cento do mercado global relojoeiro, em termos de valor. O grupo norte-americano Fossil, que trabalha sob licença muitas marcas de moda, a partir da Suíça, consegue realizar actualmente mais dinheiro na venda de relógios que o próprio LVMH.
A Suíça exporta cada vez menos relógios, mas cada vez com mais valor, batendo sucessivos recordes nos últimos anos. O valor dos relógios com calibre mecânico é mais do triplo do valor dos relógios de quartzo. Os relógios com valor à saída da fábrica superior a 3 mil francos suíços representa 5 por cento do número das exportações, mas 65 por cento do valor.
Esta é, pois, uma indústria de altíssimo valor acrescentado. Que tem acompanhado a evolução da indústria do luxo. À elite aristocrática e burguesa, clientela histórica da Place Vendôme, em Paris, sucederam, nos últimos 40 anos, classes sociais novas: tudo começou com os oligarcas do Médio Oriente e os seus petrodólares, nos anos 1970; seguiram-se os “golden boys” do início dos anos 1980, com o dinheiro ganho na especulação financeira; depois, vieram os japoneses e as grandes corporações nipónicas, a que se seguiram os que enriqueceram com o boom informático e imobiliário; finalmente, chegaram os chineses.
A progressão espectacular, inesperada no início, do luxo ocorre de 1975 a 1990. Todo o mercado do luxo foi abalado, o consumo de produtos de luxo ultrapassa pela primeira vez as fronteiras do universo de referência original. O perfil do consumidor, antes desta explosão, era fácil de desenhar – raro, rico, exigente e caprichoso. Com o alargamento do número de consumidores de luxo, chegam os elementos da classe média. A imagem de luxo enraizado numa tradição de séculos, reservado a uma elite de privilegiados, desapareceu.
Por outro lado, o produto de luxo começou a aparecer nas grandes e médias superfícies. Nasce assim uma nova categoria de consumidores de luxo. A grande distribuição propõe essencialmente produtos de luxo alimentares como sejam o caviar, o salmão fumado, o paté, os vinhos grands crus…
O aparecimento de jóias e de relógios de ouro nas grandes superfícies contribui igualmente para atrair ao luxo uma nova clientela – “o apetite vem com o comer”.
Um estudo europeu, realizado há exactamente 20 anos mostrava que 46 por cento dos europeus tinham adquirido um produto de luxo considerado “excepcional” no decurso dos três anos anteriores. Por nacionalidades, os italianos comandavam, seguidos dos franceses, ingleses, espanhóis e alemães. Hoje, com a crise a atingir a maior parte destes países, o consumo de luxo só não baixa porque o factor turismo consegue anular o seu efeito negativo. Paris, Londres, Roma ou Madrid são gigantescos centros comerciais onde chineses, brasileiros e outros chegam todos os dias, em multidões mais ou menos organizadas, para comprar.
A massificação do luxo, a sua banalização, implicam um deslocamento correspondente da expressão de diferenciação para uma sofisticação muito mais elevada ou – parece contraditório, mas não é – para um carácter de simplicidade distintiva, em oposição ao comportamento da maioria.
Por outras palavras, os muito ricos e sofisticados procuram desesperadamente fugir daquilo que as novas massas de consumidores (sobretudo chinesas) compram. Neste jogo do gato e do rato, há nichos que esses muito ricos e sofisticados frequentam, na esperança de não serem descobertos pelo dinheiro novo.
Uma boa ponte para a questão que aqui nos trouxe: o conceito de Alta Relojoaria.
Em 1972, um grupo de investidores, liderados por Joseph Kanoui , comprou a Cartier Paris. O seu novo Presidente, Robert Hocq, que criou a frase “Les Must de Cartier" (um quadro terá ditto numa reunião – “Cartier, It's a must!"), começou a lançar em 1976 novos produtos, numa estratégia delineada com o seu director-geral, Alain Dominique Perrin. Era a época dos célebres isqueiros. E era o começo do interesse dos grupos financeiros, por um lado, de moda, depois, na indústria relojoeira. Em 1988, a Cartier adquire a Piaget e a Baume & Mercier. Em 1991, Perrin funda o Comite International de la Haute Horlogerie, organizando em Genebra o primeiro salão, numa dissidência com Baselworld. Em 1993, o Grupo Vendôme, hoje Richemont, toma a maioria do capital na Cartier.
O italiano Franco Cologni, quadro do Richemont Group, está por detrás da criação, em 1992, da Association Interprofessionnelle de la Haute Horlogerie, que promovia o diálogo entre manufacturas, grossistas, retalhistas e público consumidor. Cerca de 200 pontos de venda, dos mais importantes do mundo, eram seus membros.
Em Portugal, a delegação da AIHH era composta por 11 marcas, representadas pelos importadores: Girard Perregaux (Diamantouro), Ebel (Olindo Moura), Audemars Piguet e Jaeger-LeCoultre (Torres Distribuição), IWC e Zenith (J. Borges de Freitas), Corum (via Espanha) e Cartier, Vacheron Constantin, Piaget e Baume & Mercier (Vendôme Ibérica). Quanto a lojas membros da AIHH, eram a Machado Joalheiro e a Marcolino Relojoeiro (ambas no Porto), Ourivesaria Portugal, Torres Joalheiros, Elysée Jóias, Ourivesaria Pimenta, Ourivesaria Camanga e Reparar & Encantar (em Lisboa) e Pires Joalheiros (Braga).
A AIHH acabou em 2005, dando lugar à Fondation de la Haute Horlogerie (FHH), com três membros fundadores – o Richemont Group, a Audemars Piguet e a Girard Perregaux. O objectivo é a promoção da Alta Relojoaria no mundo. Organiza desde então o Salão de Genebra, que em 2015 comemorará 25 anos. Em Portugal, o Embaixador da FHH é António Machado, da Machado Joalheiro. Franco Cologni esteve por detrás de todas estas movimentações, podendo dizer-se que ele é o “inventor” do conceito moderno de Alta Relojoaria.
Se Cologni é o pai da Alta Relojoaria, pode dizer-se que Nicolas Hayek foi o pai do renascimento da indústria relojoeira. Ou que o luxemburguês Jean-Claude Biver (ex-Omega, ex-Blancpain, Hublot, actual responsável pelo segmento de relojoaria do LVMH) será decerto uma das personagens-chave da próxima década em termos de estratégia no relacionamento luxo-alta relojoaria.
Quanto ao futuro, com Hayek morto mas o filho, Hayek Jr, fortemente estabelecido à frente do Swatch Group, os olhos voltam-se para o Richemont Group, onde Franco Cologni se reformou. Quem dirigirá o polo relojoeiro do grupo? Bernard Fornas (ex-Cartier)? Georges Kern (IWC)? Jerôme Lambert (ex-Jaeger-Lecoultre, actual senhor Montblanc)? Aproveitemos para dar uma vista de olhos pelo SIHH deste ano, que acaba de se realizar.
A 24ª edição do Salon International de la Haute Horlogerie teve 14 mil visitantes (mais 9 por cento que no ano passado), entre eles 1.300 jornalistas (mais 12 por cento). Salão privado e profissional, a que se acede apenas por convite (há 18 anos que estamos presentes) o SIHH teve 16 marcas - A. Lange & Söhne, Audemars Piguet, Baume & Mercier, Cartier, Greubel Forsey, IWC, Jaeger LeCoultre, Montblanc, Officine Panerai, Parmigiani Fleurier, Piaget, Ralph Lauren Watch & Jewelry, Richard Mille, Roger Dubuis, Vacheron Constantin e Van Cleef & Arpels.
Uma realidade completamente diferente é a Baselworld. Com décadas de história, atingiu em 2013 um novo recorde de visitantes - 122 mil (mais 17 por cento que em 2012); e de jornalistas - 3.610 (mais 9 por cento). A feira, a maior do mundo no seu género, foi totalmente remodelada em 2013. Mais de mil dos 1.460 expositores, de 40 países, renovaram os seus stands, envolvendo investimentos avultados.
Passemos agora à questão da Alta Relojoaria
A FHH, que luta pelo valores patrimoniais e culturais da Alta Relojoarias, que procura treinar relojoeiros e outros artífices, que forma vendedores e combate a contrafacção, assume-se como guardiã dos parâmetros que devem ser tidos em consideração para classificar o que é ou não Alta Relojoaria. Desde logo, sabendo-se que a maior parte das profissões em Alta Relojoaria nem sequer dizem respeito à relojoaria propriamente dita. Estamos então a entrar no mundo dos Métiers d’Art, cuja tradução em português seria Artes Aplicadas.
A FHH dispõe de uma Comissão composta de personalidades internacionais (curadores, peritos, coleccionadores, empresários e jornalistas) que a ajuda a delimitar o perímetro da relojoaria técnica e ou preciosa que se pode considerar Alta Relojoaria. O critério é revisto todos os anos.
Edições especiais ou limitadas são especialmente admiradas. Depois, nos relógios mecânicos, seja o calibre simples ou complicado (calendário perpétuo, cronógrafo ou cronógrafo rattrapante, repetição minutos, turbilhão ou outras complicações) esse mesmo calibre terá que ser concebido, desenvolvido e manufacturado, no todo ou em parte, pela respectiva marca ou por um fornecedor de reputação estabelecida. Por outras palavras, qualquer marca pode aspirar a produzir Alta Relojoaria.
Os componentes dos calibres terão que ser da máxima qualidade, bem como os seus acabamentos. O exterior deverá mostrar criatividade, originalidade, autenticidade e distinção… palavras, palavras… palavras.
Quanto aos relógios jóia, o mesmo se deverá passar em termos de calibre mecânico, mas nos casos de usarem calibres de quartzo, isso só pode ocorrer a fim de respeitar os requisitos estéticos das criações joalheiras… palavras, palavras, palavras.
No exterior, originalidade e autenticidade. Uso de materiais nobres e de pedras com certificação de origem. Para estar no clube de Alta Relojoaria, as marcas devem ter cultura e especialização, capacidade de investir em pesquisa e desenvolvimento. Preocupação em manter os saberes ancestrais e de os transmitir a jovens relojoeiros. Para as marcas mais antigas, exige-se legitimidade e tradição; para as marcas novas, personalidade e originalidade. Cada uma deve ter um DNA reconhecível, uma rede de distribuição selectiva e qualificada, um serviço pós-venda competente e de qualidade.
A.Lange & Söhne, Audemars Piguet, Baume & Mercier, Bovet, Cartier, Chanel, Chopard, Christophe Claret, Corum, De Bethune, Girard-Perregaux, Greubel-Forsey, Harry Winston, Hermès, IWC, Jaeger-LeCoultre, Montblanc, Officine Panerrai, Parmigiani Fleurier, Piager, Ralph Lauren, Richard Mille, Roger Dubuis, TAG Heuer, Vacheron Constantin e Van Cleef & Arpels são as marcas que fazem actualmente parte do primeiro pelotão da FHH, os partners.
Depois, a FHH reconhece ainda como marcas de Alta Relojoaria: Andreas Strehler, Antoine Preziuso, Armin Strom, Beat Haldimann, Blancpain, Boucheron, Breguet, Breitling, Bulgari, De Grisogono, Delaneau, DeWitt, F.P. JOURNE invenit et fecit, Franck Muller, Glashütte Original, H. Moser & Cie, Hautlence, Hublot, Jaquet Droz, Jean Dunand, JeanRichard, Kari Voutilainen, Louis Vuitton, Ludovic Ballouard, Maîtres du Temps, MB&F, Mc Gonigle, Omega, Patek Philippe, Paul Gerber, Perrelet, Philippe Dufour, Pita Barcelona, Roger W Smith, Rolex, Romain Gauthier, Speake-Marin, Thomas Prescher, Ulysse Nardin, Urwerk, Vianney Halter e Zenith.
Há um anos, perguntei a um histórico do sector, António Luís Moura, sobre o que pensava deste conseito. Dizia ele: “Alta Relojoaria é uma abstração comercial, que serviu para criar uma distância em relação à relojoaria "mass market". É um conceito que me pergunto se hoje fará sentido”.
Numa altura em que o comércio online aumenta ao ritmo de 25 por cento ao ano, e em que a massificação do luxo parece querer ameaçar a noção do próprio luxo, as marcas mais prudentes e os observadores mais atentos começam a pensar sobre o tema - como preservar o luxo, como será o luxo do futuro?
Ora, segundo alguns, entre os quais nos encontramos, a preservação do luxo passará pela utilização e preservação dos chamados métiers d'art, um património que na sua vertente europeia está, em muitas especialidades, em risco de desaparecer.
Algumas marcas de luxo têm feito tudo para preservar esse savoir faire adquirido ao longo de séculos, cimentado em técnicas muitas vezes empíricas, transmitidas oralmente e por observação ao longo de gerações.
Na relojoaria, seja através da esmaltagem, da gravação, da cravação, do desenho em miniatura, da maqueterie ou de outros métiers d'art, a utilização dessas técnicas, que exigem horas de trabalho manual, que são feitas por cada vez menos gente, resulta sempre em peças verdadeiramente únicas, porque irrepetíveis. Se, a esse exterior artístico, se juntar um interior com o estado da arte em termos de micromecânica, teremos então o verdadeiro luxo. Que não se compadece com o ritmo das encomendas - não é mecanizável, precisa de tempo para ser feito.
E, assim, seria o regresso do luxo, tal como o entendemos - objectos excepcionais, feitos por gente excepcional.
Os parâmetros mais objectivos
Para além destes parâmetros altamente subjectivos – ninguém consegue definir hoje o que é uma verdadeira manufactura – podemos voltar a esta discussão, se quiserem – há outros, mais objectivos, que se preocupam com a qualidade de um relógio.
Desde logo, se ele mede bem o tempo. Estamos a falar de cronometria. A Suíça tem uma entidade oficial, independente, o Contrôle Oficielle Suisse des Chronomètres ou COSC.
Não vale a pena citar aqui todas as regras do COSC, mas digamos que um relógio de pulso, mecânico, para ser considerado cronómetro certificado, tem que ser submetido a 14 dias de testes, durante os quais a variação diária não pode ultrapassar os -4/+6 segundos. Para os relógios com calibre de quartzo, a variação máxima permitida diária é de ±0.07 segundos.
Em 2012, os últimos números conhecidos, foram emitidos 1.732.526 certificados de cronometria. No quadro, as marcas, os calibres sumetidos ao COSC e, entre parentesis, os calibres submetidos em 2011 e respectiva variação.
Rolex 799.000 (751.000) +6,4%
Omega 526.000 (509.000) +3,3%
Breitling 157.000 (154.000) +1,9%
Mido 61.000 (49.000) +24%
Tissot 50.000 (7000) +614%
Panerai 29.000 (34.000) -15%
Chopard 23.000 (29.000) -21%
Enicar 16.000 (17.000) -6%
Titoni 15.000 (21.000) -29%
Invicta 10.000 (0) –%
De notar que a Rolex comanda desde há muito esta tabela, que a Breitling só produz relógios com certificado COSC, sejam eles mecânicos ou de quartzo, e que a Omega e a Tissot, do Swatch Group, ameaçam a liderança da Rolex – os primeiros porque usam cada vez mais calibres co-axiais, que facilmente atingem os parâmetros COSC, os outros porque desenvolveram com a ETA calibres de base industrial, que serão feitos às centenas de milhar, muito baratos, e que também facilmente atingem esses parâmetros. A Tissot acaba mesmo de ganhar um concurso internacional de cronometria com um relógio de PVP abaixo dos mil euros.
Já gora, de referir que o novo e revolucionário calibre do Swatch Sistem51 facilmente ultrapassaria as exigências COSC. Estamos a falar de um relógio com um PVP à volta dos 130 ou 140 euros… Mas a Swatch nunca deverá submeter os seus relógios ao COSC, porque isso implica custos, apenas por isso.
Há depois os chamados selos de qualidade. Desde logo, o mais antigo do mundo no seu género, o Poinçon de Genève, dirigido pela Fundação Timelab. Instituido em 1886 pelo cantão, o Poinçon de Genève é a mais antiga certificação relojoeira do mundo. Tem novas regras desde 2011, que abrangem agora a qualidade não apenas do calibre (isocronismo, decoração)mas também do relógio como um todo. Os relógios têm que ser montados no cantão, a partir de componentes na sua maioria fabricados no cantão. Até hoje, já foram produzidos cerca de 1,3 milhões de relógios com o selo de qualidade Poinçon de Genève. De notar que todos os Roger Dubuis são Poinçon de Genève e outro grande produtor de relógios com esse selo é a Vacheron Constantin. Ao ver este selo de qualidade “invadido” por outras marcas, como a Cartier, a Patek Philippe decidiu há uns anos criar o seu próprio selo, Punção Patek (PP),com um grau de exigência ainda maior. Há ainda o punção Fleurier (a Chopard fez até agora o único relógio com os três selos – COSC, Poinçon de Genève e Poinçon Fleurier).
Finalmente, há as regras Swiss Made, que acabam de ser também reformuladas, para ter uma maior exigência. Acima de tudo, dizem respeito à percentagem de valor acrescentado que está no produto final e na formação de preços. Caixas, mostradores, ponteiros e pulseiras poderão ser, em muitos casos, fabricados na China, mas os calibres mecânicos garantem um valor acrescentado que faz o Swiss Made. Pelo menos 50 por cento dos compomnentes do movimento têm que ser manufacturados na Suíça. EtTudo tem é que ser montado na Suíça.
Já agora, alerto para as novas regras da concorrência, que irão revolucionar nos próximos anos a indústria relojoeira helvética.
O Swatch Group, o maior do mundo em termos de relojoaria, recebeu finalmente autorização das autoridades federais suíças para começar a diminuir gradualmente o fornecimento de calibres e componentes aos seus rivais.
A Comissão Suíça para a Concorrência (Comco) reverteu uma decisão tomada em Julho passado e onde bloqueava os planos do Swatch Group de deixar de fornecer a empresas fora do seu universo. A luz verde do Comco encerra uma saga de 12 anos, iniciada em 2001, quando o Swatch Group disse que queria deixar de fornecer movimentos não montados a outras empresas. Este anúncio provocou ondas de choque através da indústria, dado que o grupo funciona em monopólio em zonas estratégicas para a relojoaria, como sejam as espirais.
Definitivamente, nos próximos dois anos, o Swatch Group fornecerá apenas 75 por cento de calibres e componentes aos seus rivais, baseando-se num nível médio do que forneceu entre 2009 e 2011. Os fornecimentos baixarão para 65 por cento nos anos 2016 e 2017 e para 55 por cento nos dois anos seguintes. A partir de 31 de Dezembro de 2019, deixará de estar obrigado a fornecer a partes terceiras.
O Swatch Group tem no seu universo a Nivarox, que funciona quase sozinha no fornecimento de espirais para toda a indústria relojoeira helvética. Tem também a ETA, a grande unidade de produção industrial de calibres e componentes, que abastece maioritariamente o sector (calcula-se que em 70 por cento).
Com esta decisão, O Comco está a dar mais alguns anos aos grupos concorrentes (LVMH, Richemont, Kering) para prosseguir no investimento em unidades de produção de calibres, coisa que eles têm feito principalmente na última década, prevendo este desfecho.
O grande problema põe-se em relação a marcas independentes, que não têm massa crítica (nem dinheiro) para justificar o investimento sempre avultado em fábricas de calibres.
Mas a questão mais séria é a das espirais. A técnica está mais ou menos dominada, mas a produção só é rentável quando se está a falar de milhões de unidades. E há muito poucas excepções ao monopólio da Nivarox (Rolex, A. Lange & Söhne, Roger Dubuis, Minerva e pouco mais).
De qualquer modo, unidades de produção independentes de calibres, como Sellita, Dubois Depraz, Vaucher ou Soprod têm crescido exponencialmente nos últimos cinco anos e deverão crescer ainda mais nos próximos, dada a procura. Mas, neste momento, a maior parte dos seus calibres são feitos com base ETA, que modificam ou a que acrescentam módulos, e sempre com espirais Nivarox.
Com a questão das espirais a ser a mais difícil de resolver, os concorrentes do Swatch Group têm agora seis anos para se adaptar. A 1 de Janeiro de 2020 a torneira deverá estar fechada...
Ao falar de Alta Relojoaria, não quero deixar de vos referir duas pistas, que dizem directamente respeito a Portugal. O primeiro é o Le Roy 01, o relógio de bolso mais complicado do mundo ao seu tempo – encomendado no início do século XX pelo português António Augusto de Carvalho Monteiro, o Monteiro dos Milhões, dono, por exemplo da Regaleira, em Sintra, e grande coleccionador de relógios. Quando ele morreu, os herdeiros venderam o relógio, que se encontra actualmente no Museu do Tempo de Besançon.
O outro caso diz respeito igualmente a um coleccionador de relógios – Medeiros e Almeida. A sua colecção é a mais valiosa do país e uma das maiores em mãos privadas de exemplares Breguet. Uma visita à sua Casa-Museu, em Lisboa, vale a pena.
A exposição já vai longa e vejo alguns de voz a olhar para o relógio. Isso não me preocupa tanto como ver algum de vós a abanar freneticamente o pulso, a confirmar se o relógio não terá parado…
Mas deixo-vos, se me permitem, ainda com mais um dado.
Quanto vale uma marca?
A empresa suíça BV4 é especialista em achar o valor de uma marca, estando para isso habilitada por uma norma ISO. Há anos que publica o ranking das mais valiosas marcas suíças de relojoaria e acaba de revelar mais uma lista — a independente Rolex, continua na liderança, com um valor de 5,074 mil milhões de francos suíços.
No grupo dos cinco primeiros não há alterações em relação ao ano anterior, mas enquanto a Rolex, a Cartier, a Omega e a Swatch vêem subir o seu valor enquanto marca, já a também independente Patek Philippe sofre ligeira quebra, de 1 por cento.
Os principais pilares da relojoaria mundial — independentes, Swatch Group, Richemont Group, LVMH e Kering — estão representados.
Nos independentes, além da Rolex e da Patek Philippe, aparecem a Chopard, a Audemars Piguet e a Breitling. O maior grupo de relojoaria do mundo, o Swatch Group, além da Omega, consegue meter no Top 20 a Swatch, a Breguet, a Longines, a Tissot e a Rado.
Já o Richemont Group, o maior do mundo em termos de alta relojoaria, aparece com a Cartier, IWC, Jaeger-LeCoultre, Piaget, Vacheron Constantin e Baume & Mercier.
Quanto ao maior grupo do mundo em termos de luxo, o LVMH tem aqui a TAG Heuer e a Hublot.
Finalmente, o Kering, o grupo de luxo rival do LVMH, surge com a Girard-Perregaux.
A maior valorização é da sempre impressionante Rolex, seguida da TAG Heuer, da Swatch e da Hublot. Girard-Perregaux e Baume & Mercier sofrem a maior quebra. A IWC e a Hublot são as únicas que sobem dois lugares no ranking. De um modo geral, e para quem vai acompanhando os bastidores da indústria relojoeira suíça, este quadro é um indicador fiel do que se passou nos últimos tempos…
Segundo o “Best Swiss Brands 2013”, um estudo da Interbrand, dezasseis manufacturas relojoeiras estão entre as 50 marcas mais valiosas suíças, com duas delas Rolex e Omega, no Top Ten. Este estudo valoria a marca Rolex em 6,6 mil milhões de francos suíços, colocando-a em quinto lugar, depois da Nescafé, Roche, Novartis e Nestlé. Neste estudo, a Omega, em décimo lugar, está avaliada em 3,3 mil milhões de francos suíços.
Continua a ser espantoso, este mundo da relojoaria!
Obrigado pelo vosso tempo.
Se quiserem continuar a seguir esta temática, têm possibilidade de o fazer através do mensário grátis online “Relógios & Canetas”. Ou através do meu blog, Estação Cronográfica.
Fernando Correia de Oliveira
Gostei e Gostei muito, principalmente da defenição do Sr.António José Moura.
ResponderEliminarAquele abraço.
Chegado por email:
ResponderEliminarCaro Fernando
No seu artigo o Fernando dedica-me umas linhas:
Há um anos, perguntei a um histórico do sector, António Luís Moura, sobre o que pensava deste conceito.
Dizia ele: “Alta Relojoaria é uma abstração comercial, que serviu para criar uma distância em relação à relojoaria "mass market". É um conceito que me pergunto se hoje fará sentido”.
Não consigo imaginar nenhum motivo em que eu me questione sobre a interesse da noção de Alta Relojoaria.
Tive dúvidas sim, sobre a capacidade de manter o sonho de Alta Relojoaria, quando o Grupo Richemont decidiu dissolver a AIHH.
Felizmente, pouco depois apareceu a FHH.
Estive sempre envolvido neste percurso que a Relojoaria fez para renascer das cinzas.
Sempre fui um fã do grande trabalho de liderança do sonho Alta Relojoaria, exercido por Franco Cologni.
Estou ao seu dispor para qualquer outro esclarecimento.
Obrigado. Cumprimentos
António Luis Moura