[...] Conservou-se de pé, imóvel, perdido num caos de pensamentos. De súbito um ruído seco, lembrando o duma mola emperrada, cortou a mudez. Surpreendido D. Juan quase deixou cair o frasco. Inundou-o um suor mais frio do que aço de punhal. O galo de madeira pintada do relógio familiar surgiu e cantou três vezes. Era daqueles maquinismos engenhosos, de que se serviam os sábios da época para despertarem à hora fixada para as suas lucubrações. A aurora avermelhava já as janelas. D. Juan tinha passado dez horas a reflectir. O velho relógio era mais fiel do que ele ao cumprimento dos seus deveres para com Bartolomeu. Aquele mecanismo compunha-se de corda, alavanca e rodas dentadas, enquanto ele tinha o músculo peculiar aos homens, que se chama coração. [...]
Honoré de Balzac (1799 - 1850), escritor francês, in O Elixir da Longa Vida
Sem comentários:
Enviar um comentário