terça-feira, 10 de agosto de 2010

Meditações - o Verão anda por aí

Desde o chão

A pele porosa do silêncio
agora que a noite sangra nos pulsos
traz-me o teu rumor de chuva branca.

O verão anda por aí, o cheiro
violento da beladona cega a terra.
Cega também, a boca procura
trabalhos de amor. Encontra apenas
o nó de sombras das palavras.

Palavras... Onde um só grito
bastaria, há a gordura
das palavras. Palavras -
quando apetecem claridades súbitas,
o sumo estreme, a ponta extrema

to teu corpo, arco flecha,
corola de água aberta
ao fogo a prumo do meu corpo.

Do chão ao cume das colinas
da terra, eis as areias. Cala-te.
Deita-te. Morre. debaixo dos meus flancos.
A terra toda em cima. Agora arde. Agora.

Eugénio de Andrade (1923 - 2005)

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