segunda-feira, 28 de junho de 2010

Memória - Pensamentos III*

Nas Musas Portuguesas, ou Segundas Musas, D. Francisco Manuel de Melo tem um soneto intitulado “Diálogo da vida, e o Tempo”:

Vida – Quem chama dentro de mim? Tempo – O Tempo ousado.
V. – Entraste sem licença? T. – Tenho há muito.
V. – Que me queres? T. – Que me ouças. V. – Já te escuto.
T. – Prometes de me crer? V. Fala avisado.
T. – Errada vais? V. – Também tu vais errado.
T. – Essa é condição minha? V. – Esse é meu fruto.
T. – És mulher descuidada? V. – És velho astuto.
T. – Erro sem dano meu? V. – Assaz tens dado.
T. – Ai, vida, como passas? V. – Perseguida.
T. – De quem? V. – De ti? T. – O Tempo o gosto nega.
V. – O Tempo é ar? T. – A vida é passatempo.
V. – Tu já nem Tempo és? T. – Nem tu és já Vida.
V. – Vai para louco? T. – Vai-te para cega.
Vedes como se vão a Vida, e Tempo?

Como dizia Camões,

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Há 45 anos, em 1963, nascia O Tempo e o Modo, que se proclamava “revista de pensamento e acção”. Pedro Tamen, seu primeiro editor literário, formulou assim o seu programa: “A acção começa na consciência. A consciência, pela acção, insere-se no tempo. Assim, a consciência atenta e virtuosa procurará o modo de influir no tempo. Por isso, se a consciência for atenta e virtuosa, assim será o tempo e o modo”.

Quase meio século depois, num mundo onde o tempo (i)mediatizado domina o quotidiano público e privado, quem e como se pensa o Tempo e o Modo português?

*Crónica A Máquina do Tempo, publicada a 01/02/08 no suplemento Casual do Semanário Económico

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