Relógio
O meu relógio coitado,
Tem a corda avariada.
E por muitas coisas que faça,
Já não presta para nada.
Tão valente tem sido,
Agora foi-se-me abaixo.
Mas por enquanto não acho,
Que tenha nada partido.
O que deve estar é vencido,
Dá-me sinais de cansaço.
Nunca me tinha falhado,
E funcionou sempre bem.
E hoje não sei o que tem,
O meu relógio coitado.
Na linda prenda que usava,
Com imenso prazer.
Nunca cheguei a saber,
Com que pedras trabalhava.
Muita alegria me dava,
Ao romper da madrugada.
Dava o toque da alvorada,
Com coragem e valentia.
Mas já não faz o que fazia,
Tem a corda avariada.
As vezes dou-lhe em mexer,
A ver se o ponho a trabalhar.
Até me faz admirar,
Como isto pode acontecer.
Já tenho dito para a mulher,
E tu não vez esta desgraça.
Ela encontra-lhe graça,
A olha para mim a rir.
E eu tenho que desistir,
Por mais coisas que faça.
O meu relógio antigamente,
Nem um segundo falhava.
Agora quer é descanso,
Mas isso é constantemente.
E tudo acho diferente,
E até na própria pancada.
Não tem a toada,
Dos tempos que já lá vão.
Por perder toda a acção,
Já não presta para nada.
Anónimo, poesia popular portuguesa
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