segunda-feira, 5 de outubro de 2009

1582 - o ano com menos dez dias

Clavius, com Gregório XIII ao fundo

Como nos recorda aqui o blog Tribo de Jacob, o 5 de Outubro de 1582, uma quinta-feira, foi uma data muito especial para alguns países do Ocidente cristão, incluindo Portugal. Não houve nem 6, nem 7, nem 8, nem 9, nem 10, nem 11, nem 12, nem 13, nem 14 de Outubro e o dia seguinte foi, por decreto papal, sexta-feira, 15 de Outubro.

Tudo se deve à reforma do calendário, a passagem do calendário juliano, introduzido por Júlio César, para o calendário gregoriano, o que ainda hoje nos rege, e introduzido em 1582 pelo Papa Gregório XIII, através da bula Inter Gravíssimas.

O decreto papal é imediatamente seguido por Espanha, Itália e Polónia. Portugal, que estava já sob domínio de Filipe II, também mudou o seu calendário nessa altura. Em França, Henrique III decreta o ajuste dos dias em Dezembro.

A mudança do calendário juliano ou antigo para o calendário gregoriano ou moderno não teve lugar ao mesmo tempo em todo o mundo, o que causa uma certa confusão na harmonização de datas e na datação de eventos entre os séculos XVI e XX.

A Grã-Bretanha e os países protestantes apenas adoptaram o novo calendário no século XVIII, preferindo, segundo o astrónomo Johannes Kepler, "estar em desacordo com o Sol a estar de acordo com o Papa". A adopção do calendário na Grã-Bretanha e suas colónias em 1752 foi pretexto para protestos e motins porque muitos pretendiam receber o seu salário mensal em vez da correcta proporção de 21 dias de trabalho efectivos.

Os países da tradição da igreja ortodoxa apenas o adoptaram no início do século XX. Na Rússia, só após a Revolução de Outubro de 1917, que segundo o calendário gregoriano ocorreu já em Novembro, é que a recém-formada URSS adoptou o calendário gregoriano, em 1918.

E porque é que a Igreja de Roma viu necessidade em reformar o calendário? Essencialmente por motivos religiosos - a determinação da Páscoa, a festa móvel que determina depois todo o calendário litúrgico, estava a ser cada vez mais desfazada do Equinócio da Primavera, a altura natural para a sua ocorrência.

E porque é que tal acontecia? É que o calendário juliano, introduzido em 46 a.C. tinha acumulado ao longo de 1500 anos de funcionamento cerca de 10 dias de desvio em relação ao chamado ano trópico (o tempo que Terra leva a fazer uma órbita completa ao Sol - 365,24219 dias). Ora, não estamos exactamente perante 365 e um quarto, mas um pouco menos. O calendário juliano, com os anos bissextos de quatro em quatro anos, dava o ano trópico como tendo exactamente 365 dias e um quarto - um desvio de 0,00781 dias por ano.

O calendário gregoriano foi elaborado por uma comissão designada pelo papa, tendo à sua frente o jesuíta Clavius, que estudara matemática com Pedro Nunes, em Coimbra. Ele toma como base o juliano, e transforma-o muito pouco. A grande diferença passa a ser na ocorrência dos anos bissextos. Enquanto no calendário antigo eles se sucediam de quatro em quatro anos, sempre que os anos eram múltiplos de 4, no calendário gregoriano isso não ocorre quando, além de multiplos de 4, são anos múltiplos de 100, deixando a excepção para quando são múltiplos de 400.

Parece confuso, mas percebe-se melhor se se disser que, por exemplo, 2004, 2008, 2012 são bissextos, 1800, 1900, 2100 não são bissextos e 1600, 2000, 2400 são bissextos.

Deste modo, o calendário gregoriano consegue aproximar-se mais do ano trópico, com a duração média de 365,2425 dias. Mesmo assim, e porque não há calendários perfeitos, o calendário que hoje nos rege acumula um desvio de 0,00031 dias/ano ou de 1 dia a cada 3226 anos.

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